São Paulo, quarta-feira, 08 de janeiro de 2003

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ANTONIO DELFIM NETTO

O PT-jacobino

Há um PT-jacobino que insiste em impor à área econômica uma política macroeconômica original que eles supõem conhecer, mas da qual fazem o maior segredo. As experiências com as políticas macroeconômicas da "esquerda salvacionista" são uma retumbante coleção de fracassos. Como sempre soube a "esquerda séria", elas terminam, invariavelmente, com a ditadura "sobre" o proletariado... O mais recente exemplo é o do Zimbábue, onde o sr. Robert Mugabe repete, com diligência e eficiência, os erros que a esquerda jacobina cometeu em todos os países africanos de que se apoderou e destruiu pela força.
O desenvolvimento se faz pela mobilização dos recursos humanos e materiais do país, e o papel do governo na construção da infra-estrutura física e social é fundamental. O problema é que ele só pode exercê-lo na medida em que gerar poupança orçamentária para financiá-las, ou quando tiver a confiança interna e externa para colocar dívida pública a taxas de juros reais inferiores às taxas de retorno reais dos seus investimentos. O grande economista Mugabe, que crê que os preços sobem "porque os empresários são gananciosos", que "as forças do mercado assaltam os pobres", que "o câmbio negro é obra de especuladores", está tentando o desenvolvimento com déficit fiscal que se aproxima de 20% do PIB e já produz uma inflação avassaladora. Todos sabemos como, mais cedo ou mais tarde, isso vai terminar...
A política macroeconômica tem que produzir a estabilidade dos preços, estimulando a economia a crescer a uma taxa robusta sem criar problemas de solvibilidade na dívida interna e na externa. Isso sugere o uso moderado da poupança externa para reduzir a volatilidade do câmbio.
No mais, é o governo cumprir o seu papel na criação da infra-estrutura material (transporte, energia etc.) e social (educação, saúde etc.) dentro do equilíbrio fiscal. O setor privado, se dispuser de taxa de juro real de longo prazo igual à taxa de retorno dos seus investimentos, mobilizará os fatores de produção disponíveis em combinações produtivas eficientes. Isso exige, entretanto, uma política de crédito adequada, um sistema tributário pouco distorcivo e a construção de instituições que facilitem o funcionamento dos mercados financeiro, de capital e, particularmente, de trabalho.
E o Banco Central? O PT-jacobino insiste que o papel do Banco Central é produzir o desenvolvimento por meio da manipulação da taxa de juro nominal de curto prazo. Trata-se de lamentável equívoco. Todo o conhecimento econômico teórico não rejeitado pela pesquisa empírica nos últimos 30 anos mostra que isso produziria, no prazo médio, mais inflação do que crescimento. O que não se deve é fixar metas inflacionárias excessivamente exigentes. Em condições normais, em que não existe dúvida sobre a solvibilidade das dívidas interna e externa, o papel do Banco Central é tentar manter a taxa de juro real de longo prazo igual à taxa de retorno das atividades econômicas. É por isso que a taxa de juro sobe quando a economia está se expandindo (a taxa de retorno está subindo) e diminui quando a economia está retraindo (a taxa de retorno está caindo).
A diferenciação do governo Lula com relação ao de FHC não será na política macroeconômica. Se houver, será nas políticas públicas setoriais e nas prioridades sociais.


Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras nesta coluna.


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