São Paulo, quarta-feira, 08 de janeiro de 2003 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Hora de redefinições
RODOLFO KONDER
Aqui, na América Latina, surgem valores compartilhados e obstáculos igualmente comuns. Nações que sulcaram juntas as águas turvas do autoritarismo, das ditaduras militares, aportam agora nas mesmas praias da democracia. Pluripartidarismo, eleições regulares, alternância no poder -o Estado de Direito vale para quase todas. Elas chegaram ao século 21 trazendo em seus porões cargas semelhantes. Do México à Patagônia, os conquistadores europeus esmagaram os povos nativos e suas cosmogonias, acumularam escravos e espelhos; depois, perderam-se em labirintos de igual desenho totalitário e agora redescobrem juntos a liberdade e a diversidade. Buscam aqui, no continente americano, o que os europeus ainda procuram na Europa: um multiculturalismo solidário. Pregam uma "globalização solidária". Somente com a ajuda recíproca e organizada entre os diferentes países dos cinco continentes, com o apoio mútuo entre as diversas culturas, com a cooperação entre as inúmeras etnias, com a fraternidade entre as nações que integram os novos blocos e fazem parte da ONU -somente assim- os seres humanos estarão aptos a participar de um processo global de desenvolvimento e a enfrentar, com chances razoáveis de vitória, os riscos do tribalismo, do terrorismo, da droga, do desemprego, das desigualdades crescentes, do fanatismo religioso, da destruição do meio ambiente. Caso contrário, continuaremos a caminhar para o abismo. O século 21, portanto, pode ser o fim -ou o recomeço. Se despertou enfurecido, no dia 11 de setembro, poderá passar à história como o reencontro da democracia e da paz, a redescoberta da liberdade e dos direitos humanos. Será um novo Holocausto ou a hora das redefinições, o momento sagrado em que os seres humanos vão se reintegrar à natureza, para finalmente sobreviverem com dignidade e sabedoria. Neste momento, a ira ainda alimenta quase todas as vinhas. A razão bateu em retirada. É tempo de falcões. O futuro uiva como um lobo em nossos quintais ainda enfeitados para o Natal. Rodolfo Konder, 64, jornalista e escritor, é diretor cultural do UniFMU. Foi secretário da Cultura do município de São Paulo (1993-2000) e presidente da seção brasileira da Anistia Internacional (1989-90). Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Roberto Romano: Tempos e multidões Próximo Texto: Painel do leitor Índice |
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