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CLAUDIO ANGELO
Direito de enrolar
OU BEM o ministro Carlos
Alberto Menezes Direito é
um gênio dos tribunais, ou
bem ele cometeu um tremendo erro de cálculo ao interromper o julgamento da ação de inconstitucionalidade contra a Lei de Biossegurança, na última quarta-feira.
Quanto mais tempo o reverendíssimo juiz demorar para apresentar seu veredicto ao Supremo
Tribunal Federal, mais embriõezinhos poderão ser "assassinados"
por cientistas "malvados" em laboratórios Brasil afora. Afinal, do jeito que está hoje, a obtenção de células-tronco embrionárias é legal.
Portanto, a demora na retomada
do julgamento não interessa à Santa Madre Igreja. Como é pouco
provável que ele consiga virar a cabeça de seus pares, ainda mais
quando três deles já se declararam
a favor da lei, é o caso de perguntar
-data venia o trocadilho- se Direito fez direito ao pedir vista.
Seja qual for a resposta, quem
não fez direito foram os contendores de ambos os lados.
Os beatos fizeram mais uma vez
questão de torcer os fatos ao argumentarem que a lei foi aprovada
"sub-repticiamente", que é impossível dizer se um embrião é inviável
antes de implantá-lo e que as novas
pesquisas com a chamada pluripotência induzida de células adultas
dispensam a "barbárie".
Mentira, mentira e mentira. A lei
atual deu entrada no Congresso na
primavera de 2003 e de lá só saiu
no outono de 2005, sensivelmente
diluída pelo lobby religioso da Câmara. Limitou o número e o tipo de
embriões que podem ser usados
pelos cientistas brasileiros. Ainda
assim, é melhor que nada.
Embriões inviáveis só são indistingüíveis dos viáveis para quem
não tem um microscópio. Por fim,
os estudos de Shinya Yamanaka e
James Thomson, citados pelo advogado da igreja, Ives Gandra Martins, para demonstrar a inutilidade
das células-tronco embrionárias,
ainda pertencem ao terreno da
pesquisa básica. Estão tão ou mais
longe de resultar em terapias que
as pesquisas que Gandra Martins
deseja proibir.
Acontece que na guerra santa pelo apoio da opinião pública, os
cientistas também usaram bombas
sujas. É falso afirmar que todos os
embriões excedentes vão parar no
lixo -há uma resolução do Conselho Federal de Medicina que veda o
descarte. E chamar os blastocistos
de "pré-embriões", termo repetido
no STF pela presidente, Ellen Gracie, é mandracaria verbal -como
se a mudança do nome lhes retirasse o status de seres humanos.
Os cientistas não precisam disso.
Tudo indica que o bom senso venceu e eles já ganharam a parada.
Pela primeira vez na história deste
país, sua mais alta corte resolverá
que um código moral formulado
em uma sociedade de pastores no
fim do Império Romano não serve
para guiar a feitura das leis no século 21. Demorou.
CLAUDIO ANGELO é editor de Ciência
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