São Paulo, terça-feira, 08 de abril de 2008

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TENDÊNCIAS/DEBATES

A natureza do escorpião

ABRAM SZAJMAN

Sesc e Senac foram criados e são mantidos pelo empresariado comercial e de serviços para benefício de toda a sociedade

NUNCA SE falou tanto na responsabilidade social dos empresários. Porém, ao mesmo tempo, verifica-se inédita onda de ataques e ameaças contra as mais consolidadas e bem-sucedidas expressões do compromisso empresarial com esse objetivo.
O equívoco das manifestações pela extinção, diminuição ou fragmentação drástica do chamado Sistema S começa pelo próprio rótulo, útil como recurso de simplificação jornalística, mas impróprio por misturar entidades autônomas, diferentes em história, estrutura e forma de ação.
O Sesc (Serviço Social do Comércio) e o Senac (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial), ligados ao setor comercial e de serviços, foram criados nos anos 40 do século passado por empresários que se mobilizaram para oferecer, com recursos próprios, melhores condições de vida e oportunidades a uma classe trabalhadora urbana que crescia explosivamente. Graças a essa iniciativa pioneira, o Brasil conta hoje com uma estrutura nacional de originalidade e exemplaridade reconhecidas mundialmente.
Em 2006, o conjunto dos departamentos regionais do Sesc nos Estados e no Distrito Federal realizou cerca de 655 milhões de atendimentos em programas de educação, saúde, cultura, lazer e assistência. No mesmo ano, o Senac atendeu perto de 2,1 milhões de alunos em todo o país.
Essas entidades de direito privado são objeto de intensa fiscalização, tanto no que se refere à aplicação de seus recursos quanto à excelência de seu desempenho. Em nível estadual, Sesc e Senac têm conselhos regionais formados por representantes de empresários, trabalhadores e do governo federal. Em nível federal, um Conselho Fiscal, com maioria de representantes do governo, analisa e audita as contas, o que também é feito pela Controladoria Geral da União e pelo Tribunal de Contas da União.
Tão importante quanto as ações de órgãos especializados é a fiscalização direta pelo público. Semanalmente, cerca de 300 mil pessoas freqüentam as 31 unidades do Sesc-SP, desfrutando de condições de segurança, conforto, acessibilidade e higiene pautadas por critérios internacionais. Predomina o segmento de menor renda: 87% do 1,3 milhão de matriculados no Sesc-SP têm renda familiar inferior a cinco salários mínimos.
As 60 unidades do Senac-SP têm mais de 12 mil alunos nos cursos técnicos e mais de 11 mil em graduação, pós-graduação e extensão. Outras 308 mil pessoas passam anualmente por cursos livres, seminários, palestras e eventos de formação, aperfeiçoamento e atualização. Retratado com regularidade pela imprensa, esse trabalho se realiza também por meio de portais, SescTV, CDs e DVDs do selo Sesc e publicações das edições Sesc e editora Senac.
Muitos projetos têm servido de modelo a políticas públicas nas áreas social e educacional, caso do Mesa Brasil Sesc, iniciativa contra a fome e o desperdício de alimentos que, em 2007, complementou 260 milhões de refeições servidas a pessoas carentes por instituições sociais de todo o Brasil, com alimentos doados que, de outra forma, seriam descartados.
Ou do trabalho social com idosos, iniciado em 1963. Ou ainda do Dia do Desafio, iniciativa mundial de estímulo à prática esportiva, coordenada no continente americano pelo Sesc-SP. Da mesma forma, antecipando as demandas de um mercado que se amplia e sofistica continuamente, o Senac foi pioneiro no lançamento de cursos técnicos e superiores em áreas como saúde, fotografia, hotelaria, gastronomia, moda, turismo, gestão ambiental e tecnologia da informação.
Isso sem descuidar da inclusão realizada pelo movimento de redes sociais, de estímulo a novos projetos produtivos, que compreende hoje 750 organizações ativas, ou pelo programa Educação para o Trabalho, que desde 1997 qualificou profissionalmente mais de 35 mil jovens.
Em resumo, Sesc e Senac foram criados e são mantidos pelo empresariado comercial e de serviços para benefício de toda a sociedade. Propor a extinção ou a redução drástica das contribuições que os sustentam, sem apontar alternativa viável para sua manutenção, é ameaçar o país com um retrocesso e mais exclusão dos cidadãos menos favorecidos.
É desatino equivalente ao do escorpião da fábula, que determina a própria desgraça quando não resiste à tentação da ferroada mortal na rã que, solidariamente, o conduzia à segurança da margem.


ABRAM SZAJMAN, 68, empresário, é presidente da Fecomercio-SP (Federação do Comércio do Estado de São Paulo) e dos Conselhos Regionais do Sesc (Serviço Social do Comércio) e do Senac (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial).

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