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CARLOS HEITOR CONY
A democracia e o demônio
RIO DE JANEIRO - Alguns leitores reclamaram de duas crônicas recentes
em que me manifestei contra a democracia representativa tal como ela
vem sendo praticada no Brasil e na
maioria dos países dito democráticos.
As revelações do ex-secretário do
PT Silvio Pereira, publicadas ontem,
mostram como funcionam as entranhas de um partido que se diz democrático, como o PT, no subsolo das
campanhas eleitorais, processo do
qual resultam os governantes e legisladores em nível federal, estadual e
municipal.
Antes de mais nada, o segredo. Não
o segredo de táticas ideológicas. Todos os petistas envolvidos no esquema de corrupção, lá atrás, nos começos das militâncias, foram idealistas,
abraçaram uma das vertentes do socialismo. Alguns chegaram a pegar
em armas contra a ditadura militar,
outros conspiraram e foram exilados.
Tudo boa gente, disposta a sacrificar
a própria vida pelo ideal de justiça
social e pela ética na vida pública.
Derrubada a ditadura, vem a luta
pelo poder, e o poder, na democracia
representativa, tem a fachada de
idéias, programas mirabolantes, mas
apenas a fachada. No subsolo das
alianças, das campanhas, o que prevalece é a lei da selva, dividida em
dois escalões: o dinheiro, o excremento do demônio, como dizia santo
Agostinho, e o botim, o resultado do
saque, a distribuição dos cargos e dos
lucros.
Como os icebergs, somente um
quinto da corrupção veio à tona.
Quatro quintos permanecem submersos. O próprio Silvio Pereira diz
que há muitos Valérios atrás do Valério. Tentando contar tudo o que sabe, verifica-se que sabe pouco diante
do muito que foi o projeto de o PT arrecadar criminosamente R$1 bilhão e
ficar 20 anos no poder.
Voltando à minha birra contra a
democracia representativa. Nela, o
poder não emana do povo, como se
pensa e como rezam as constituições
democráticas. O poder emana da força do dinheiro, tão corrupta como a
força das armas.
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