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Uma análise borgiana de FHC
CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
Buenos Aires - Tivessem menos problemas urgentes para resolver, Menem
e FHC poderiam ter aproveitado seu
almoço na magnífica Quinta de Olivos
para uma discussão sobre Borges.
O centenário do mais importante escritor argentino do século está sendo
comemorado este ano. Ele nasceu
num sobrado na rua Tucuman, entre
Suipacha e Esmeralda, onde hoje é a
sede da Associação Cristã de Moças.
Na primeira fase de suas ficções, Jorge Luis Borges usava com muita frequência o recurso das máscaras, em
especial para o personagem central de
cada trama, alguém que poderia governar o desenvolvimento da história.
Esse tipo de figura (comum em "A
História Universal da Infâmia" e
"Evaristo Carriego") assume outras
personalidades, imagens múltiplas,
para atingir seus objetivos finais.
O FHC do primeiro mandato foi, em
alguma medida, esse tipo borgiano.
Seu poder era mais latente e potencial do que efetivo, embora toda a cena, no fundo, dependesse dele. Usava
ora a fantasia social-democrata, ora a
neoliberal, conforme a necessidade.
Depois de "Pierre Menard, Autor de
Quixote" (o escritor que reescreveu
"Dom Quixote", copiando-o), no entanto, Borges diminuiu muito suas referências às máscaras. Achou que elas
haviam ficado previsíveis demais.
Em seu lugar, Borges adotou a analogia que Schopenhauer havia aplicado à história, a do caleidoscópio, em
que as figuras, não as peças de vidro,
se movem. Os personagens de Borges
passaram a ser os pedaços de vidro do
caleidoscópio, mudando de lugar de
maneira inesperada para o leitor.
Por convicção estética ou necessidade estratégica, FHC pode vir a se dar
conta do esgotamento da fórmula das
máscaras. Elas ficaram muito óbvias,
e ele ainda tem 42 meses de mandato.
Talvez FHC e o país ganhassem se
adotasse a lógica do caleidoscópio. O
presidente poderia surpreender o Brasil assumindo diferentes formas, não
meras imagens. Quem sabe, até, a que
tinha quando primeiro se candidatou
ao Senado, a do intelectual comprometido com reformas sociais de fundo.
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