São Paulo, terça-feira, 08 de agosto de 2006

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Rotina

Ataques de bandidos em São Paulo vão ficando habituais, enquanto políticos insistem numa batalha irresponsável

MAIO , julho e agosto. Ondas de ataques do crime organizado no Estado de São Paulo têm ocorrido com freqüência quase mensal. Na ofensiva de maio, os alvos genéricos foram os agentes da segurança pública -30 foram assassinados covardemente. A segunda vaga, em julho, foi precedida por uma série de homicídios contra servidores de presídios, mas se concentrou em ações de depredação e pirotecnia para espalhar medo.
Os ataques de ontem não trouxeram novidade. A "inovação" foi justamente a falta de inovação. Estabeleceu-se a percepção de que atentados de delinqüentes entraram para a rotina dos paulistas -dos habitantes da Grande São Paulo, em particular.
Toda violência que deixa de ser percebida como fato excepcional assinala uma degradação nas condições de vida da sociedade. Apesar disso, em uma situação como a de São Paulo, é natural e desejável que os cidadãos desenvolvam novas rotinas para conviver com uma nova realidade.
O que não é natural nem desculpável é a rotina de troca de farpas entre tucanos e pefelistas, de um lado, e petistas, do outro, cada qual tentando empurrar para o colo do outro o ônus político da "débâcle". A população, maior vítima do terror dos bandidos, está farta dessa falação.
Tão previsíveis como a ocorrência de novos atentados são rompantes demagógicos de autoridades federais dizendo que, se o Exército estivesse nas ruas, não haveria ataques. Seria preciso perguntar com que meios poucos milhares de militares inexperientes contariam para evitar que prédios públicos, agências bancárias, ônibus e supermercados fossem depredados numa região de 20 milhões de habitantes -proeza que dezenas de milhares de policiais treinados não têm conseguido.
Outro clássico do escapismo eleitoreiro se trava sobre os R$ 100 milhões de ajuda emergencial anunciados com pompa pelo governo federal no mês passado. O governo paulista reclama que o dinheiro ainda não chegou a São Paulo; o Planalto confirma, mas diz que é porque o Bandeirantes ainda não apresentou nenhum projeto para gastá-lo.
A discussão é conveniente para as duas partes. Produz a falsa impressão de que o Executivo federal faz algo relevante para ajudar no combate ao crime organizado em São Paulo. Expurga do debate o fracasso do Planalto em desenvolver uma política de Estado, permanente e previsível, para financiar a segurança pública nas unidades federativas. O assunto foi deixado à mercê do populismo do príncipe de plantão.
Já o governo paulista se agarra com afinco a qualquer querela de liberação de recursos federais. A tática serve para despistar o público do questionamento sobre as responsabilidades de um consórcio de poder que há 12 anos comanda o Estado mais rico do país. No período, a quadrilha que promove os atentados nasceu, cresceu e desabrochou -tudo dentro dos presídios estaduais.
Tão nefasta quanto a rotina de atentados é a repetição "ad nauseam" do show de irresponsabilidade de políticos que, em São Paulo e em Brasília, deveriam estar somando esforços para combater um inimigo comum.


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