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SERGIO COSTA
Carisma e poder
RIO DE JANEIRO - Carisma é um
dom que faz alguém "encher o templo" quando chega. A definição, dita
em 78 rotações como era seu costume, é de Darcy Ribeiro, numa conversa sobre Brizola nos anos 80.
Mas pode se aplicar a outros. Todo
mundo conhece gente a quem se
atribui a "alegria da festa". São esses
os mortais que têm carisma.
Anos depois da conversa com
Darcy, entendi perfeitamente o que
ele quis dizer quando vi Fidel Castro entrar no salão principal da Rio-92. Trabalhava ali, atrás da mesa do
chefes de Estado, ao lado de jornalistas de vários países, com a missão
de reproduzir debates para os boletins da ONU quase em tempo real.
Ainda eram impressos.
Ninguém nos via. Collor chegava
sempre com seus passos marciais e
nem sequer dava bom dia a alguém.
Vários líderes desfilavam à nossa
frente, indiferentes a quem estava
ao redor. Até que, após uma varredura de seguranças, entrou Fidel.
Dava para pegar no ar a excitação
que tomou conta do plenário. Fidel
havia "enchido" um templo repleto
de lideranças de países infinitamente mais poderosos e ricos do
que Cuba. Indiferente ao burburinho que causou, mesmo entre chefes de Estado, sentou-se ao nosso
lado antes de sua presença ser
anunciada. Perguntou o que fazíamos, brincou com a brilhantina que
reluzia na cabeça do Collor, contou
piadas, fez graça com as moças,
apertou a mão de um por um e foi se
sentar à mesa.
Só outro "comandante" fez ali a
mesma coisa: George Bush, o pai,
chefe da maior máquina de guerra
do mundo: o Exército americano.
Bush foi bem simpático com a nossa turma de Babel: bateu papo e
contou algumas anedotas em que
ria antes da platéia. Até hoje não sei
se ele fez isso por causa do Fidel,
mas é bem possível. Só não teve o
mesmo efeito. Carisma não vem de
vale-brinde com o poder.
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