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ALBA ZALUAR
Entre a lei
e a guerra
VER O filme "Tropa de Elite"
é duro, especialmente quando se sabe que o narrado é
verossímil. Quando já se ouvir falar
de tanta crueldade de traficantes e
brutalidade de policiais, fica difícil
tratar o filme somente como obra
de ficção. Se o objetivo era nocautear quem ouviu falar de, mas nunca viu tanta violência, o filme é um
sucesso, o que não o torna um filme
fascista.
Capitão Nascimento não é o Capitão América. Não é super-herói.
Ele sua, hesita, tem medo e quer
sair do Bope para cuidar da vida, do
filho que nasceu, da mulher que
não quer que ele morra. Está em
missão impossível, mas tem síndrome de estresse pós-traumático,
como muitos policiais militares,
apesar do silêncio da corporação a
respeito desse problema que só fez
crescer, ao lado do número de policiais mortos e de vítimas dos "autos de resistência", eufemismo para as batalhas campais contra os
traficantes nas favelas.
Os personagens foram construídos pela vivência de dois dos autores do livro que o inspirou. O treinamento por que passam, de máquinas de guerra no pior estilo dos
marines, não deixa a menor dúvida
sobre o militarismo que impera
nas polícias estaduais.
Não são treinados para salvar cidadãos quando estão nas mãos de
seus predadores. Não são formados para combater o crime. São
treinados para matar inimigos, para arriscar a vida calculadamente,
para não errar o tiro certeiro que
"quebra" o inimigo. Não há como
negar que o filme, por exibir tanta
crueldade, denuncia e alerta.
No entanto, o destemor dos personagens, sua repulsa à corrupção
tão escancaradamente mostrada
no filme e tão comentada na vida
real por todos da cidade traz outras
associações. São mocinhos de farda
preta a destruir o mal do qual tantos se crêem vítimas.
Primeiro, os traficantes da favela, armados por corruptos, inclusive policiais, os que mais lucram
com a guerra. Depois, os corruptos
da corporação.
Também não há como negar que
o público pode se deixar levar pela
admiração aos impolutos policiais
do Bope. A identificação com eles e
a esperança de que sejam os salvadores dos cidadãos indefesos e órfãos da segurança do Estado é inevitável. Para isso, não há nenhum
alerta ou saída.
No final, o capitão Nascimento e
seu substituto aderem à missão do
Bope, apresentado como incorruptível. Um deixa a vida para lá; o outro larga o curso de direito. O autor
inspirador do personagem explicou muito bem essa adesão: não dá
para cantar "sou PM, osso duro de
roer, defendo a lei até morrer" porque isso seria visto como "coisa de
mulherzinha". Só resta a guerra.
O filme não é fascista, é pessimista.
ALBA ZALUAR escreve às segundas-feiras nesta
coluna.
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