São Paulo, quarta-feira, 08 de outubro de 2008

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RUY CASTRO

Boa vida para entrevistados

RIO DE JANEIRO - A lei reza: repórter de jornal, de rádio ou de TV, só com diploma. Significa que são rapazes e moças que passaram por cursos de jornalismo -e, quando eles dão às ruas, ao fim do curso, não vêm "como espiões solitários, mas em batalhões", apud "Hamlet". Pois temo que, na faculdade, seus professores estejam se esquecendo de ensinar uma regra básica: ao entrevistar alguém, façam apenas uma pergunta de cada vez.
É o que mais se vê nas entrevistas coletivas que a TV transmite, principalmente aquelas com os técnicos de futebol, aos domingos, depois dos jogos. O repórter faz uma longa pergunta, que parece maior ainda pela falta de objetividade, e, quando enfim a dá por encerrada, emenda com: "Outra coisa..." -e segue-se uma segunda pergunta, tão interminável quanto a primeira.
O treinador, ou qualquer entrevistado, se for esperto, só responderá à segunda pergunta, e levará tanto tempo fazendo isto que, quando acabar, ninguém mais se lembrará da primeira. Ou responderá apenas à que lhe for conveniente, com o que a outra também irá para o espaço. Contraria frontalmente um princípio elementar da profissão: numa entrevista, o que importa não é a pergunta, mas a resposta.
Outro tipo de pergunta que tenho visto ser formulada com freqüência é aquela, também interminável e tão elaborada pelo repórter, que pode ser respondida pelo entrevistado com uma simples palavra: "Exato". Ou: "Correto". Ou, num incontrolável arroubo verbal: "É isso aí!".
E há uma forma de entrevista que começa a ficar perigosamente popular por aqui, em que o repórter não faz perguntas, mas afirmações. Foram os franceses do "Cahiers du Cinema" que a inventaram nos anos 60. Exemplo: "Seu filme é um delírio verbivocovisual". O entrevistado, feliz da vida, finge que entende e concorda.


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