São Paulo, quarta-feira, 08 de outubro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ANTONIO DELFIM NETTO

Desalavancagem

SE ACREDITARMOS na seleção natural, que sugere a sobrevivência do mais apto a adaptar-se quando o ambiente muda, temos de saudar os dois únicos bancos de investimento que souberam alterar instantaneamente o seu fenótipo e transformaram-se em bancos comerciais. Procuraram abrigo na regulação e na segurança que a legislação bancária americana lhe dá: o Goldman Sachs e o JPMorgan Chase. No meio da crise, demonstraram musculatura.
O Berkshire Hathaway, a holding de Warren Buffet, comprou US$ 5 bilhões de ações preferenciais da Goldman e tem opção para comprar outros cinco. O JPMorgan Chase vendeu 250 milhões de ações ordinárias a US$ 40 cada uma, recolhendo US$ 10 bilhões e deixando uma fila de "espera" de 15% de compradores eventuais.
Esses fatos mostram duas coisas: 1º) que o problema está longe de ser apenas de "liquidez" -sua solução envolve a volta da confiança entre os agentes do mercado- e 2º) que há alguma verdade na idéia de que o outro lado da crise é a criação de oportunidades.
Por que Buffett teria arriscado no Goldman Sachs? Certamente não apenas porque este foi competente e soube equilibrar-se no mar revolto. Numa entrevista (com os famosos Becky Quick e Joe Kernen, na NBC Television, no dia 24 de setembro), ele respondeu: "O que temos, Joe, é que todas as grandes instituições financeiras do mundo estão tentando desalavancar-se ao mesmo tempo. Tudo bem, mas, se todas estão tentando isso, você precisa de alguém no mundo que queira alavancar-se. E não há ninguém neste mundo que possa fazê-lo a não ser o governo dos Estados Unidos. O que ele está fazendo com a proposta em discussão é alavancar-se em até US$ 700 bilhões. E, se o fizer bem, e eu penso que o fará de forma razoável, ainda que não perfeita, no final terá um grande resultado. Os papéis serão comprados a 15% ou 20% do seu valor de face, e, se o governo vendê-los por qualquer coisa acima do custo do seu endividamento, acabará fazendo um grande lucro".
As coisas talvez não sejam tão simples e claras, mas Buffett tem experiência e razão. No final, as instituições financeiras que sobraram do "tsunami" e protegeram os seus ativos na compra em sociedade com o Fed e o Tesouro vão acabar fazendo bons lucros na proporção em que estes não executarão a alavancagem "perfeita"!
Em outras palavras, a distribuição dos custos (para os aplicadores) e dos lucros (dos que desalavancaram em cima do Tesouro) dependerá das "imperfeições" do programa. Foi essa intuição que complicou a sua provação no Congresso e, ao mesmo tempo, motivou Buffett...

contatodelfimnetto@uol.com.br


ANTONIO DELFIM NETTO escreve às quartas-feiras nesta coluna.


Texto Anterior: Rio de Janeiro - Ruy Castro: Boa vida para entrevistados
Próximo Texto: Frases

Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.