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CLÓVIS ROSSI
O câmbio, o peixe e o gato
SAINT ANDREWS (Escócia) -
Governos, quaisquer que sejam,
têm uma quase invencível resistência a admitir dificuldades ou problemas. O governo Lula levou essa
tendência ao paroxismo, até pelo
estilo "nunca antes" do presidente.
Por isso, é louvável que o ministro Guido Mantega reconheça, agora, que a valorização do real é excessiva e pode, se mantida por um período mais ou menos longo, "acabar
com a indústria brasileira".
Pior: o dólar está muito desvalorizado também em relação às demais moedas relevantes, com exceção do yuan chinês, praticamente
indexado a ele. Há, portanto, o risco
de se criar uma nova bolha, quando
o mundo mal está se recuperando
do estouro da bolha anterior.
Mantega, que conversa regularmente com Nouriel Roubini, o economista tornado icônico por ter sido um dos raríssimos que previu a
crise, deve ter ouvido dele a apocalíptica previsão de que se está formando uma "bolha monstro" como
decorrência do mecanismo chamado "carry trade".
Funciona assim: investidores tomam empréstimos em dólares, a juros de avô para neto, e compram
ativos por exemplo em países que
têm juros mais altos e nos quais o
dólar também está baratinho, baratinho (o Brasil se enquadra em ambos os casos).
É um dos desequilíbrios da economia mundial que deveria estar na
agenda da reunião ministerial do
G20, que terminou ontem aqui na
Escócia. Por força das imposições
industriais, sou obrigado a escrever
este texto antes de conhecer as decisões do encontro, mas as informações disponíveis indicam com certa
segurança que a discussão não
avançou o suficiente. Os ministros
voltarão ao assunto no início de
2010.
Até lá, o governo brasileiro será
obrigado a manter um olho no peixe da euforia e outro no gato do
câmbio, que pode comê-la em algum ponto futuro.
crossi@uol.com.br
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