São Paulo, quinta-feira, 09 de janeiro de 2003

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TENDÊNCIAS/DEBATES

FGTS

OCTAVIO BUENO MAGANO

Causou perplexidade a declaração do sr. ministro do Trabalho e Emprego preconizando a extinção da multa de 40% relativa ao FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), na hipótese de despedida injustificada do trabalhador.
Para o efeito indicado, argumentou que o apontado adicional, "criado como proteção ao emprego, acabou virando moeda de troca, já que, em certos casos, o trabalhador faz acordo com a empresa para ser demitido, saca o FGTS, devolve a multa de 40% ao empregador e depois é recontratado" (Folha, pág. B1, 6/1/03).
Sucede que o adicional em tela foi criado para desestimular a dispensa imotivada de trabalhadores. É o que se infere da leitura do parágrafo 1º, art. 18, da lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990, abaixo transcrito:
"Na hipótese de despedida pelo empregador sem justa causa, depositará este, na conta vinculada do trabalhador no FGTS, importância igual a 40% do montante de todos os depósitos realizados na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos dos respectivos juros".
Nas demais hipóteses, como a da extinção da empresa, a da aposentadoria previdenciária, a do pagamento de prestações relativas a financiamento habitacional, a da extinção normal do contrato a termo etc., o direito do trabalhador limita-se à possibilidade de levantar o valor derivado das contribuições mensais destinadas ao FGTS pelo empregador.
Visando à melhor compreensão do assunto, convém lembrar que, nos termos da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), de 1943, o tempo de serviço só se realçava para o efeito de estabilidade, ao cabo de dez anos e da indenização correspondente a um mês de salário por ano de serviço, na hipótese de despedida sem justa causa. Se a rescisão contratual derivasse de outras causas, como as mencionadas no parágrafo anterior, o trabalhador nada recebia.


A abolição total da multa mostra-se desarrazoada porque converter-se-ia em incentivo de rescisões contratuais imotivadas


Para remediar a omissão em tela, editou-se a lei nº 5.107, de 13 de setembro de 1966, estabelecendo a alternativa de o trabalhador continuar inserido no regime até então vigente ou optar pelo procedimento do FGTS, constituído de contribuições mensais a cargo do empregador.
A apontada possibilidade de opção foi resguardada pela Constituição de 24 de janeiro de 1967, que, em seu art. 158, XIII, incluiu, entre os direitos de natureza trabalhista, estabilidade com indenização ao trabalhador despedido ou fundo de garantia equivalente.
A alternativa de que se trata só deixou de prevalecer com o advento da Constituição de 1988, que impôs, sem condicionamentos, o regime do FGTS, preceituando o art. 10 de suas Disposições Transitórias que, até a promulgação de lei complementar disciplinando outras formas de compensação, para despedidas arbitrárias, a multa do FGTS aumentava de 10% para 40%.
Não há dúvida de que, em virtude do indigitado acréscimo, tornou-se frequente a prática fraudulenta de ser o empregado despedido para obter o valor de dita multa, sendo logo a seguir readmitido.
Para combater a apontada fraude, o que se há de exigir é atuação mais eficaz por parte dos sindicados, aos quais incumbe homologar a quase totalidade das rescisões contratuais. Paralelamente a isso, até poder-se-ia admitir a diminuição da multa de 40% para 10%, como se previa na lei nº 5.107/66, porque, nessa hipótese, não haveria tão acentuada inclinação no sentido de procedimentos fraudulentos.
Já a abolição total da multa mostra-se desarrazoada porque converter-se-ia em incentivo de rescisões contratuais imotivadas.

Octavio Bueno Magano, 74, advogado e jurista, é professor titular de direito trabalhista da Faculdade de Direito da USP.


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