São Paulo, domingo, 09 de janeiro de 2011

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CLÓVIS ROSSI

Sai a fanfarra, entram os fatos

SÃO PAULO - Já no discurso de posse, Dilma Rousseff fizera um risco no exagerado ufanismo de seu antecessor. Ajuda-memória: Lula cansou-se de proclamar que sua missão na vida era pôr três pratos de comida por dia na mesa do brasileiro. E cantou "missão cumprida" ao fim de seu período.
Aí, Dilma assume e diz a mesma coisa, ou seja, que não vai descansar "enquanto houver brasileiros sem alimentos na mesa". Significa, como é óbvio, que a missão não foi integralmente cumprida, ainda que tenha havido formidável melhora na vida dos brasileiros, pobres ou não.
Agora, Dilma cria o programa de ataque à miséria absoluta, que, também implicitamente, trinca a propaganda ufanista de que milhões de brasileiros deixaram a pobreza e passaram à classe média.
O novo programa começará exatamente por tentar estabelecer o que é pobreza, levando em conta não apenas a renda mas também o acesso a bens públicos como educação, saúde, saneamento.
Se o próprio governo tem a louvável honestidade de admitir que a pobreza no Brasil não está devidamente medida, qualquer afirmação sobre quantos deixaram de ser pobres é no mínimo temerária (chute, mais exatamente).
Se o critério para definir pobreza for o dos Estados Unidos e o de países europeus (é pobre quem ganha menos de x% da renda média do país), ruirá outra propaganda, a da queda da desigualdade.
Por esse metro, haverá fatalmente comparação entre rendas e ficará claro o que tenho escrito reiteradamente nesta Folha e acaba de ser reafirmado por Reinaldo Gonçalves (UFRJ): alterou-se apenas a distribuição de renda na classe trabalhadora (salários, aposentadorias, benefícios), sem alterações substanciais na desproporção entre tais rendas e as do capital (lucro, juro e aluguel).
Bem-vindos, pois, à realidade.

crossi@uol.com.br


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