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São Paulo, domingo, 09 de fevereiro de 2003

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ECONOMIA SEM DEFESA

A década de 90 pode ser resumida, no sistema mundial e principalmente nos EUA, como a era da economia forte que em boa medida foi beneficiada pelos "dividendos da paz". Hoje prevalece o cenário oposto: a maior economia global está cada vez mais frágil, enquanto seu governo move nova escalada militar.
O senso comum atribui à economia de guerra algumas virtudes. A mobilização de dezenas de milhares de jovens para os campos de batalha compensa parcialmente o estreitamento das oportunidades de emprego. Os fabricantes de aviões recebem novas encomendas exatamente quando a aviação civil enfrenta a maior crise de sua história.
O fim da Guerra Fria permitiu a expansão das fronteiras dos mercados e a adaptação de parte do complexo militar-industrial para finalidades pacíficas. Mas a guerra ao terrorismo, de que a ofensiva contra o Iraque é apenas mais uma batalha, promete ser longa e gerar uma onda de investimentos no uso militar das novas tecnologias, cuja fronteira é dominada por empresas norte-americanas.
A política econômica da guerra também contribui para um déficit público estimado em cerca de US$ 300 bilhões. Gastos sociais foram cortados. Ganham destaque os gastos em novos projetos de defesa, como o assim chamado "bioescudo" contra ataques químicos e bacteriológicos. As expectativas são de que o governo dos Estados Unidos tenha déficits de mais de US$ 200 bilhões ao ano até 2007.
Restam no entanto fortes dúvidas sobre a eficácia econômica da estratégia militarista. Os efeitos da guerra sobre as expectativas de consumidores e empresários podem levar a cortes duradouros de gastos.
O presidente Bush, como seu antecessor Ronald Reagan, acredita que aumentar gastos e cortar impostos é a melhor forma de reativar a economia. Mas para os céticos os efeitos negativos dos déficits sobre os mercados tendem a surgir antes e com intensidade suficiente para enfraquecer o dólar diante das principais moedas globais, o euro e o iene.
Um dólar fraco demais, ainda que os EUA dêem seguidas demonstrações de força militar, colocará o banco central dos EUA diante de pressões por uma elevação dos juros. Isso deteria uma recuperação e deprimiria todo o sistema internacional.
A reafirmação geopolítica dos EUA coincidiria com seu enfraquecimento como pólo econômico global.
Externamente, a força das armas pode ser insuficiente para coordenar interesses, em especial no comércio internacional. Ao contrário, a imposição do projeto tutelar americano ao resto do mundo pode solapar o potencial de cooperação.
Uma onda protecionista reduziria ainda mais as perspectivas de crescimento em todo o mundo.
Internamente, o governo Bush tem empolgado a opinião pública ainda traumatizada pelos ataques terroristas de 11 de setembro.
Mas uma economia fragilizada pode minar também a vantagem política doméstica alcançada por Bush.
Mais que a indefinição sobre a duração da guerra ao terrorismo internacional, o que se vislumbra é uma incerteza ainda mais radical, produzida por um governo militarmente cada vez mais forte sustentado por uma economia cada vez mais fraca.
Para os céticos, essa é a contradição que afinal arruína todos os impérios.



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