São Paulo, sexta-feira, 09 de março de 2007

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Bush em visita

A queda de barreiras e subsídios agrícolas, e não o assistencialismo, é a agenda que importa no combate à pobreza global

POR MUITO tempo a administração do presidente George W. Bush, que hoje visita São Paulo, reservou à América Latina uma diplomacia negligente. Influenciada demais pelos interesses da comunidade de origem cubana instalada nos Estados Unidos, a política de Washington para a região foi um misto de indiferença e imperícia.
São visíveis, porém, os sinais recentes de mudança na orientação que levou a Casa Branca, por exemplo, a apoiar uma tentativa de golpe na Venezuela em 2002. A nomeação do pragmático Thomas Shannon como chefe da diplomacia para a América Latina, em meados de 2005, deu início a essa transição.
Decerto a reorientação diplomática já merece críticas, como a visão de que a ascensão de regimes nacionalistas no hemisfério foi favorecida pela falta de assistência dos EUA aos pobres da região. Chega a ser patético, por exemplo, o "pacote" de ações assistencialistas, incluindo o envio de um navio-hospital e cursos grátis de inglês, com que Bush pretendeu brindar os latino-americanos antes de iniciar sua visita a cinco países da região.
Ainda assim, é muito melhor, para a América Latina, estar diante de um interlocutor capaz de discernir entre Lula, Chávez, Fidel, Morales e Kirchner.
No caso do Brasil, a maior atenção dedicada pelo governo Bush não se explica apenas por considerações de ordem político-ideológica. Mais que um ator capaz de contrabalançar o radicalismo chavista, aos olhos de Washington o governo brasileiro tornou-se o representante de uma potência do agronegócio.
A pujança das exportações de produtos do campo (e da mineração) transformou o Brasil num grande fornecedor em escala global. Como o país ampliou e diversificou seus clientes pelo mundo, ficou menos dependente do mercado americano, apesar de o comércio com os EUA ter dobrado nos últimos oito anos.
Ator global no agronegócio, o Brasil negocia diretamente com americanos e europeus na Rodada Doha de liberalização comercial. Do mesmo modo, as atenções se voltam aos produtores brasileiros de álcool quando os EUA anunciam a mudança de sua matriz energética a favor dos biocombustíveis, como estratégia para depender menos do petróleo.
Tanto na agenda de Doha como na do álcool a hipocrisia do mundo rico se manifesta. A redução de barreiras e subsídios agrícolas no Primeiro Mundo é talvez o meio mais poderoso à mão para combater a pobreza no planeta. À política da esmola é preciso antepor a do desenvolvimento -e o Brasil tem um papel a cumprir nesse debate.


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