São Paulo, segunda-feira, 09 de junho de 2008

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Mudança?

Crise questiona capacidade ilimitada de gastar e contrair dívida, que caracterizou os EUA nas últimas décadas

HÁ QUASE 30 anos, desde a crise que associou o segundo choque do petróleo à alta da inflação mundial, não se via um questionamento tão forte da hegemonia do dólar e dos Estados Unidos na economia mundial.
Não foi por outro motivo que uma fala do presidente do Banco Central Europeu, ameaçando elevar os juros para combater a alta dos preços, ajudou a produzir uma intensa fuga do dólar na sexta-feira passada. Investidores assustados também com a notícia de aumento do desemprego nos EUA derrubaram as Bolsas, as americanas com especial virulência, e buscaram refúgio em outras moedas e nos contratos de petróleo, cujo preço disparou e roçou os US$ 140 o barril.
Como no final da década de 1970, estão de volta os fantasmas da inflação e do choque no custo da energia. A este respeito -lembrando os embates políticos com o cartel da Opep no passado- foi quase dramático o comunicado de ministros de Energia do G8, reunidos ontem no Japão, que exigiu dos países exportadores de petróleo que invistam mais na ampliação da oferta e aumentem a transparência dos dados acerca dos níveis atuais de produção.
Mas a crise encontra agora a economia americana bastante fragilizada, imersa numa ressaca de desconfiança após anos de crédito farto e barato. Além disso, como o consumo desabrido das famílias e do governo americano veio sendo financiado com capital estrangeiro, a saúde financeira dos EUA depende hoje, muito mais que no passado, de seus parceiros comerciais. Mais da metade da dívida pública americana já está em mãos de estrangeiros -contra pouco mais de um terço no início da década.
Esses elementos, se ainda estão longe de representar a ruína da posição central dos EUA na economia mundial, exercida desde o final da Segunda Guerra, representam um desafio diferente, e muito mais pedregoso, para a condução da política econômica. Na retórica dos dois candidatos à Casa Branca, não há nenhum sinal de que tenham percebido mudança nos ventos.
O democrata Barack Obama quer endurecer a relação com grandes parceiros comerciais dos EUA, indispensáveis para o equilíbrio financeiro da maior economia mundial. Mira a China, e também fala em rever o Nafta -o bloco de livre comércio formado com o Canadá e o México. O republicano John McCain insiste na estratégia de Bush de diminuir tributos, sem se importar em como financiar o crescente déficit fiscal daí resultante.
O fato é que a situação privilegiada dos Estados Unidos não os tem obrigado a gerir seu orçamento público da maneira como os demais países o fazem -constrangidos por limitações macroeconômicas bastante claras. A confiança mundial no dólar chancelou políticas econômicas, como a do presidente Bush, populistas e irresponsáveis, se avaliadas nos termos da ortodoxia.
Chegou a hora da mudança? Em caso positivo, ela parece ter pego os dois postulantes à Presidência dos EUA desprevenidos.


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