São Paulo, sábado, 09 de novembro de 2002

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TENDÊNCIAS/DEBATES

A venda das ações do Banco do Brasil deveria ter sido postergada?

NÃO

Um trabalho sério

EDUARDO GENTIL

Vamos desdobrar a questão em duas partes: Por que fazer a venda das ações? E por que fazê-la agora?
Pelo visto no noticiário recente, creio que está se formando um consenso forte sobre o mérito da venda de ações do Banco do Brasil, que representa a etapa conclusiva de um processo de fortalecimento da instituição que vem sendo implementado pelo banco há pelo menos três anos. Mas vale a pena recapitular as razões ou justificativas principais.
O bloco de ações ordinárias colocado à venda representa 17,8% do capital do BB -7% das ações já estão no mercado e cerca de 15% ficarão com o BNDES e a Previ. A União, portanto, permanecerá com mais de 60% do capital do banco e continuará com o controle dele. A operação em andamento permitirá que o BB passe a ter uma base muito maior de acionistas e liquidez garantida para as ações. A consequência natural deverá ser uma valorização substancial da posição de controle detida pela União.
A colocação dessas ações no mercado permitirá que o BB ingresse no Novo Mercado da Bolsa de Valores de São Paulo. Será a primeira grande empresa de atuação nacional a ingressar neste segmento da Bovespa, com importância emblemática para o fortalecimento do nosso mercado de capitais. Nos últimos anos, o mercado de ações tem encolhido no Brasil, em parte devido ao número limitado de bons papéis de empresas com transparência, boa governança e proteção aos direitos dos minoritários. A entrada do BB nesse segmento servirá de exemplo e estímulo a outras empresas, contribuindo para uma recuperação do mercado de capitais.
O impacto no próprio banco também será muito positivo. Quando falei com um diretor do BB sobre a operação, ele comentou com muito entusiasmo: "Este é o evento mais importante na história do banco!". Quem tem acompanhado o Banco do Brasil mais de perto sabe que sua gestão tem trabalhado incansavelmente nos últimos anos para chegar a este momento. Com essa venda de ações pulverizada, o BB terá milhares de acionistas no Brasil e será acompanhado de perto por eles e pelos principais analistas de ações aqui e no exterior.
O compromisso do BB de manter uma gestão profissionalizada, a transparência e a boa performance tenderá a fortalecê-lo como a maior instituição financeira do país. Um banco como o Banco do Brasil precisa zelar por sua saúde financeira, perspectivas de crescimento e estratégia. A valorização de suas ações permite maior competitividade e redução de custos de capital. Para isso, gestão e governança são fundamentais, além de regras de supervisão bancária adequadas e ambiente macroeconômico favorável.
Vamos à segunda parte.
Todo processo de venda de um ativo importante do setor público deve equilibrar vários fatores, com estímulo ao mercado de capitais, valor ou preço do ativo, condições do mercado e nível de preparação para implementar a venda.
No que diz respeito ao valor do ativo, embora o BNDES esteja impedido de comentar esta questão, vale dizer que os coordenadores contratados para a oferta fizeram um trabalho abrangente de análise, que abordou várias metodologias e permitiu aos vendedores decidir pelo prosseguimento da operação.
Além disso, relatórios recentes de analistas do mercado fazem várias abordagens sobre a questão de valor, incluindo performance recente, comparação com indicadores de performance e valor de outros bancos, além de potencial de rentabilidade futura. Nos últimos 12 meses, enquanto o Ibovespa desvalorizou-se em 22%, as ações do Banco do Brasil apresentaram valorização de 23%, em parte em razão da expectativa da adesão do banco ao Novo Mercado. De maneira geral, nas últimas semanas houve sinais de melhoria na tendência dos mercados acionários no Brasil.
Finalmente, a preparação para um lançamento de ações desse porte é complexa, demorada e tem gastos relevantes -entre aprovações governamentais, contratação de coordenadores, aprovação da CVM, preparação da campanha de marketing e outras tarefas. Todo esse processo foi iniciado em abril deste ano, quando a decisão de levar o BB ao Novo Mercado e vender as ações foi divulgada. Chegamos até aqui, após mais de oito meses de trabalho, com sucesso.
Portanto, considerando todos esses fatores, creio que é oportuno, sim, levar o processo adiante neste momento, dado a melhoria da percepção de mercado. Tudo indica que o lançamento poderá ter grande êxito. Mas vale lembrar que os vendedores sempre se reservam o direito de reavaliar o fechamento final da operação, previsto para o fim deste mês, dependendo da reação do mercado e da demanda (volume e preço).
Vivemos um processo de transição inédito no país, com uma interação de mútuo respeito entre o governo atual, que tem responsabilidade de gestão até o final do ano, e a equipe de transição do novo governo. Faz parte desse processo a análise cuidadosa dos projetos em andamento, considerando todos os seus aspectos relevantes. Faz parte também a cautela necessária para que não sejam prejudicados ou adiados projetos importantes para o país, como este do Banco do Brasil.


Eduardo Gentil, 47, economista, é diretor de Produtos Estruturados do BNDES.


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