|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TENDÊNCIAS/DEBATES
A venda das ações do Banco do Brasil deveria ter sido postergada?
SIM
Venda inoportuna
RICARDO BERZOINI
O processo de venda, pelo Tesouro Nacional, de cerca de 17,5% das
ações com direito a voto do Banco do
Brasil pode ser questionado sob mais de
um aspecto.
Em primeiro lugar, a venda não é um
bom negócio. Todos temos acompanhado o comportamento das ações no
mercado nacional. Ainda estamos num
momento de baixa, provocado por crises sucessivas, internas e externas. Só
agora as bolsas ensaiam uma alta, que,
todos esperamos, seja sustentável.
Em particular, as ações do Banco do
Brasil têm tido um histórico irregular.
Não surtiram efeito as seguidas tentativas do governo e da direção do banco de
garantir um crescimento estável e consistente das cotações do papel.
Essas tentativas remontam à capitalização do BB, em 1996, quando o Tesouro Nacional e a Previ, fundo de pensão
dos funcionários do banco, aportaram
mais de R$ 8 bilhões, numa tentativa de
reequilibrar o balanço patrimonial após
seguidos exercícios de prejuízo.
Naquela oportunidade, tanto o governo como a direção do banco fizeram
promessas de que o respeito da instituição para com o mercado e os acionistas
minoritários estaria garantido pelas
mudanças estatutárias realizadas.
A criação do voto de qualidade para as
principais decisões do Conselho de Administração do banco obrigaria o governo a conquistar o apoio de pelo menos um voto da iniciativa privada, detentora, juntamente com os funcionários, de três vagas no conselho. A medida daria maior poder aos acionistas
não-governamentais.
O dia-a-dia da gestão do banco mostrou que os mecanismos não foram suficientes. O poder de mando do próprio
banco na Previ minou o poder dos minoritários. Esse desmonte culminou
com a extinção, em 2002, da representação dos funcionários. Hoje, o governo
federal, por meio do Tesouro Nacional
ou da Previ, indica todos os sete membros que compõem o Conselho de Administração do Banco do Brasil.
Diante disso, não é de estranhar que
os agentes de mercado fiquem receosos
da ação governamental sobre os negócios do Banco do Brasil. Eles perceberam que a transparência na gestão e o
respeito aos acionistas não passaram de
simples retórica do atual governo.
Por falar em transparência, a direção
do BB deve uma prestação de contas sobre a apuração de diversas operações,
seguramente irregulares, ocorridas nos
últimos oito anos. Casos como a concessão de empréstimos irregulares e liberações de garantias da Encol, apurados em CPI, não mereceram do banco
um tratamento rigoroso.
Operações com fundos administrados pela BBDTVM, que deram ao Banco do Brasil um prejuízo de mais de R$
140 milhões na virada do dólar, em 1999,
e operação irregular de venda de títulos
públicos da tesouraria do banco para
fundos administrados pela BBDTVM
-que alterou o balanço em mais de R$
600 milhões no segundo semestre de
2000, conforme denunciou a imprensa
à época-, permanecem na obscuridade. As punições foram brandas. Não há
notícia de nenhuma demissão.
O fato é que esse percurso torto das
ações e dos atos de gestão construíram o
vexame da chamada de capital de junho
de 2001. Cinco anos depois da emissão
dos bônus lançados quando da capitalização de 1996, apenas um número ínfimo de desinformados acionistas compareceu para exercer seu direito de
subscrição.
A própria entrada no Novo Mercado
da Bovespa, propósito divulgado pela
direção e, por si só, elogiável, fica sob
risco, a merecer uma análise mais profunda dos reguladores do Novo Mercado. Porém ainda mais grave é a oportunidade política do negócio.
Temos um novo presidente eleito. A
nação já disse "não" à continuidade da
gestão nos moldes de Fernando Henrique. O país avalizou as críticas de Lula
ao atual governo e votou em um programa com outras prioridades, no qual os
bancos públicos terão sua estratégia revista para se adequarem aos objetivos
sociais do novo governo.
Sem deixar de ser competitivos e
atuantes no mercado comercial bancário brasileiro, os bancos federais irão incorporar funções que podem ajudar o
país a retomar o crescimento econômico, gerar emprego e renda e reduzir as
desigualdades sociais.
Portanto falta legitimidade a essa ação
governamental de colocar à venda um
patrimônio de alguns bilhões de reais às
vésperas de entregar o cargo ao novo
presidente. Cabe ao presidente Fernando Henrique determinar a suspensão
do processo de venda e confiar o futuro
do Banco do Brasil e suas ações ao novo
governo.
Ricardo Berzoini, 42, bancário, deputado federal pelo PT-SP, é vice-líder do partido na Câmara
dos Deputados.
Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES A venda das ações do Banco do Brasil deveria ter sido postergada? - Não - Eduardo Gentil: Um trabalho sério Próximo Texto: Erramos Índice
|