UOL




São Paulo, domingo, 09 de novembro de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

VINICIUS TORRES FREIRE

Picanha, suor e cerveja

SÃO PAULO - "Picanha, suor e cerveja" é uma utopia nacional-popular. Churrasquinho, pelada de futebol, novela, piscina; samba-funk, rap, suor e cerveja são uma idéia de boa vida para muito brasileiro.
A cada disparate do presidente, como os da turnê africana, vem a imagem do Lula da Silva de bermudão e camiseta regata, no pós-pelada, diante de um braseiro, tomando a cerveja de que o brasileiro gosta, fraca e pálida. A soneca da tardinha interrompe a leitura do livro, chato, ou do relatório de duas páginas apenas, como gosta o presidente.
Mas esnobar o ambiente de pelada e atribuir disparates, preconceitos e o metaforismo nacional-populista aos hábitos populares do presidente é menos preconceituoso? De resto, Lula gosta de coisas ótimas, como rabada, que muita gente "bem" só come em restaurante "fusion" ou "contemporâneo" ou quando aparece como "coda à la vaccinara" no cardápio.
O problema não é de gosto, mas do gosto limitado em qualidade e em variedade, que configura um espírito tacanho, míope, o que costuma redundar em vulgaridade. No poder, tal avareza de idéias e sentimentos torna-se arrivismo, temperado muita vez pela narcísica indiferença pela opinião dos eleitores-cidadãos.
A vulgaridade petista não é pior nem melhor que a tucana (embora ninguém tenha descido ao nível de Collor). Os tucanos se acham tão chiques. No poder, catavam o jatinho do governo para as férias do familião, para ficar num só exemplo.
À maneira dos inimputáveis, Lula parece não se amolar com as gafes. Ministros fazem papelão e, se pressionados, pedem desculpas a contragosto. É o caso da viajante Benedita, de Graziano, do Fome Zero, que insultou os nordestinos, e da extraordinária empáfia e insensibilidade do ministro da Previdência, que deu uma pendura em nonagenários.
Dizer que é preciso mais grandeza e de gente de horizontes mais largos soa como (e talvez seja) moralismo pré-sociológico. E, pensando nos indizíveis Bush e Chirac, até que não estamos tão mal em termos de lideranças. Mas o Brasil é precário demais. Precisa do melhor.



Texto Anterior: Editoriais: REFORMA TRIBUTÁRIA

Próximo Texto: Pretória - Eliane Cantanhêde: A África é uma África
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.