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CLÓVIS ROSSI
De vassouras e fracassos
SÃO PAULO - No fim de 1980, a Folha escalou-me para ser correspondente em Buenos Aires. O câmbio local era igual ao de hoje no Brasil: moeda supervalorizada, dólar
baratíssimo, a rigor a única coisa
barata na Argentina.
Fomos comprar trivialidades para completar a casa. Vassoura, por
exemplo. Compramos no supermercado da esquina, não em uma
Daslu qualquer da vida. Olhei a etiqueta: "Made in USA". Pensei: país
que importa vassoura está condenado ao fracasso. Acertei, não por
inteligente, mas pelo óbvio.
Lembrei-me da vassoura de Buenos Aires ao ler a análise do Iedi
(Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial) sobre o mau
resultado da indústria no mês de
setembro.
Diz: "A excessiva valorização do
câmbio, que já vinha afetando fortemente e de forma inequívoca setores como têxtil, vestuário, calçados e madeira, estaria agora atingindo também outros segmentos,
retraindo ainda mais profundamente a taxa de crescimento global
da indústria. Se, de fato, a queda de
4,5% da produção de bens de consumo duráveis (em relação ao mês
anterior, descontados os efeitos sazonais) estiver relacionada ao esmorecimento das exportações apurado em setembro e à concorrência
das importações incentivadas pelo
valor da moeda nacional, maiores
cuidados na política cambial tornar-se-ão agora absolutamente urgentes".
O que não entendo é como o óbvio demora tanto para entrar na
pauta, em especial na das autoridades. É evidente que a manutenção
de uma moeda sobrevalorizada afeta a produção local.
Podemos não estar importando
vassouras, porque somos sempre
menos exuberantes do que os argentinos (no fracasso como no sucesso). Mas podemos estar importando um "suave fracasso", para
usar expressão do embaixador Rubens Ricupero.
crossi@uol.com.br
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