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Depois da anestesia
Desconfiança acerca da economia grega lembra que ainda existem esqueletos importantes da crise a serem expostos
DEPOIS DO calote do emirado de Dubai, ontem
foi a vez de a Grécia
perturbar os mercados
financeiros. O pretexto foi o rebaixamento da nota de risco de
crédito do pequeno país europeu, anunciado por uma agência
global. A notícia derrubou as
Bolsas e provocou uma corrida
para o dólar, que se valorizou.
De fato, se um país como o Brasil ostentasse os indicadores da
economia grega, já estaria provavelmente abandonado à própria
sorte. A nação europeia de 11 milhões de habitantes, com PIB de
US$ 330 bilhões, carrega uma dívida prestes a ultrapassar US$
400 bilhões. O governo grego
gasta bem mais do que arrecada:
a diferença, ou deficit, representa quase 13% do PIB, muito acima do limite de 3% exigido de
economias, como a grega, que
adotam o euro como moeda.
O drama da Grécia, longe de
isolado, integra uma coletânea
de casos do endividamento acelerado que tomou de assalto praticamente todas as economias
periféricas do bloco europeu ou
contíguas. Durante a euforia, investimentos estrangeiros fluíram aos borbotões para nações
como Grécia, Bulgária, Romênia,
Eslováquia e Hungria.
Deficits externos de até 25%
do PIB foram registrados nessas
nações, o que indicava uma confiança cega, e irresponsável, na
manutenção do crescimento baseado em altíssima dosagem de
capital estrangeiro. A reversão
abrupta do quadro, após o epicentro da crise em setembro de
2008, deixou esses países de pires na mão.
A situação foi remediada com a
avalanche de dinheiro emergencial colocada à disposição pelas
autoridades econômicas europeias, rede de socorro da qual
participou, também, o Fundo
Monetário Internacional. O endividamento e a incapacidade de
gerar renda e recursos fiscais pelas próprias pernas -situação
agravada pela recessão e pelo desemprego- não desapareceram,
entretanto, em muitas dessas
nações da periferia da Europa.
Se o caso da Grécia, como o de
Dubai, lembra que ainda há esqueletos importantes da crise a
serem expostos, também denuncia um novo pico de inquietação
nos chamados mercados. A ansiedade desta vez está diretamente associada a uma série de
indicações de que os governos
não têm como sustentar, por
muito mais tempo, o nível cavalar de estímulo, fiscal e monetário, que evitou a depressão.
É como um paciente que sobreviveu durante muito tempo
sob o efeito de anestésicos. Não
se sabe como vai reagir à retirada
paulatina da sedação.
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