São Paulo, quarta-feira, 09 de dezembro de 2009

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Depois da anestesia

Desconfiança acerca da economia grega lembra que ainda existem esqueletos importantes da crise a serem expostos

DEPOIS DO calote do emirado de Dubai, ontem foi a vez de a Grécia perturbar os mercados financeiros. O pretexto foi o rebaixamento da nota de risco de crédito do pequeno país europeu, anunciado por uma agência global. A notícia derrubou as Bolsas e provocou uma corrida para o dólar, que se valorizou.
De fato, se um país como o Brasil ostentasse os indicadores da economia grega, já estaria provavelmente abandonado à própria sorte. A nação europeia de 11 milhões de habitantes, com PIB de US$ 330 bilhões, carrega uma dívida prestes a ultrapassar US$ 400 bilhões. O governo grego gasta bem mais do que arrecada: a diferença, ou deficit, representa quase 13% do PIB, muito acima do limite de 3% exigido de economias, como a grega, que adotam o euro como moeda.
O drama da Grécia, longe de isolado, integra uma coletânea de casos do endividamento acelerado que tomou de assalto praticamente todas as economias periféricas do bloco europeu ou contíguas. Durante a euforia, investimentos estrangeiros fluíram aos borbotões para nações como Grécia, Bulgária, Romênia, Eslováquia e Hungria.
Deficits externos de até 25% do PIB foram registrados nessas nações, o que indicava uma confiança cega, e irresponsável, na manutenção do crescimento baseado em altíssima dosagem de capital estrangeiro. A reversão abrupta do quadro, após o epicentro da crise em setembro de 2008, deixou esses países de pires na mão.
A situação foi remediada com a avalanche de dinheiro emergencial colocada à disposição pelas autoridades econômicas europeias, rede de socorro da qual participou, também, o Fundo Monetário Internacional. O endividamento e a incapacidade de gerar renda e recursos fiscais pelas próprias pernas -situação agravada pela recessão e pelo desemprego- não desapareceram, entretanto, em muitas dessas nações da periferia da Europa.
Se o caso da Grécia, como o de Dubai, lembra que ainda há esqueletos importantes da crise a serem expostos, também denuncia um novo pico de inquietação nos chamados mercados. A ansiedade desta vez está diretamente associada a uma série de indicações de que os governos não têm como sustentar, por muito mais tempo, o nível cavalar de estímulo, fiscal e monetário, que evitou a depressão.
É como um paciente que sobreviveu durante muito tempo sob o efeito de anestésicos. Não se sabe como vai reagir à retirada paulatina da sedação.


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