São Paulo, segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

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RICARDO YOUNG

Que lógica?

Quem assiste à TV deve ter notado a substituição do noticiário policial pelas tragédias ambientais. As inundações estão por toda a parte. Repetem-se neste verão o desespero da população e a incompetência das autoridades frente à violência das chuvas. São cidades e cidades inundadas.
Os que buscam o litoral neste período têm-se surpreendido com o número de praias impróprias para banho dados a quantidade de coliformes fecais vivos encontrados pela Cetesb, a falta de abastecimento de água e o agravamento da situação do lixo.
A questão ambiental, ao que parece, começa a chamar mais a atenção da grande mídia à medida que se agravam os dramas humanos. Quanto às autoridades... Estas parecem não perceber que há uma nova lógica na gestão pública que precisa orientar as políticas governamentais.
A SOS Mata Atlântica mostrou que, dos 43 corpos d'água (rios e lagos) pesquisados em 12 Estados do Nordeste, Sudeste e Centro-Oeste, nenhum possui suas águas em boas condições. O quadro é mais que preocupante: 70% estão em condições apenas regulares; 25%, ruins; 5%, péssimas.
Outra constatação é que a baixa qualidade das águas se deve mais à poluição por esgoto que por efluentes industriais. Aliás, justamente aquela de responsabilidade exclusiva do setor público, que mostra capacidade reguladora inversamente proporcional a de gestora.
Com 80% da população em cidades com crise habitacional, crise de abastecimento de água e ausência de saneamento, vê-se que as politicas públicas não se prepararam para a era da sustentabilidade.
Pena e constrangimento foi o que provocou uma cena recente mostrada na mídia. Uma senhora, toda feliz, agarrada à sua TV de 45", recém-arrematada em uma megaliquidação, seguida de outra cena onde uma dona de casa, com água pela cintura, chorava a perda, pela enésima vez, de todos os seus bens na inundação.
Está na hora de as autoridades entenderem que não haverá qualidade de vida se saneamento, tratamento de esgotos, gestão de recursos hídricos e política habitacional preventiva não estiverem no centro das agendas municipais.
A crise ambiental é séria, e o número de cidades vitimadas é crescente. A lógica da gestão pública tem de mudar. É na infraestrutura das cidades, nos subterrâneos das ruas, nas periferias longe dos holofotes, nas várzeas de rios, nas encostas de morros e nos aterros sanitários que reside a nova lógica das políticas públicas.
De nada adianta o acesso aos bens de consumo se as condições para que a população de baixa renda possa usufruí-los não forem garantidas pelo poder público.
Se essas questões não forem enfrentadas com coragem, veremos a exuberância do crescimento econômico oprimindo o desenvolvimento em vez de garanti-lo.

RICARDO YOUNG escreve às segundas-feiras nesta coluna.


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