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São Paulo, segunda-feira, 10 de fevereiro de 2003

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DECEPÇÃO E INTERESSE

A transferência para o governo federal de práticas e experiências tipicamente sindicais foi anunciada por Luiz Inácio Lula da Silva ao longo da campanha presidencial. Se era preciso provar a distância que existe entre o funcionamento de um governo e a condução de um sindicato, o caso da "decepção" do presidente em relação aos produtores de álcool, na semana passada, foi eloquente. O teor da frase de Lula revela um sentimento de que acordos fundados na palavra podem sustentar uma ação de Estado.
Não foi a primeira vez que usineiros sabotaram intenções de governo. Sua incapacidade de manter a oferta do álcool combustível ao longo do tempo foi um dos fatores que puseram a perder anos de investimento (e de fartos subsídios) numa matriz energética mais limpa ambientalmente e menos dependente das vicissitudes da economia global.
Como já ocorreu no passado, um surto na cotação internacional do açúcar fez com que as usinas ampliassem sua produção para exportação, à custa do fabrico de álcool. O resultado foi um aumento nos preços do álcool no mercado doméstico, o que afetou não apenas os proprietários de carros movidos a esse combustível, mas também o preço da gasolina, que usa álcool anidro como aditivo.
Tentar conter essa busca de lucro rápido através de um diálogo com produtores que ostentam um histórico de falta de credibilidade é pouco promissor. Para retomar o Proálcool num ambiente de câmbio desvalorizado, é preciso que o governo obtenha garantias reais que representem ônus financeiros para os produtores que não cumprirem sua parte.
Se não for assim, é melhor deixar que o mercado se encarregue de produzir breves picos de alta lucratividade no setor, entremeados por longos períodos de ganhos baixos, em que usineiros não cessam de acorrer aos governantes de turno pedindo a volta do Proálcool ou o aumento do teor de álcool anidro na gasolina. Essa não é uma questão de decepção presidencial, mas de interesse público.



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