São Paulo, segunda-feira, 10 de março de 2008

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RUY CASTRO

Ao alcance da nossa gratidão

RIO DE JANEIRO - Em 1808, o príncipe regente d. João chegou ao Rio com sua corte. Mudou a nossa história e passou a maior parte dos 200 anos seguintes sendo chamado de gordo, feio, porco, devorador de frangos, fraco, indeciso, ocioso e, como se não bastasse, corno. Bela maneira de agradecer ao homem que nos inventou como nação, ao transferir para cá a coroa, o trono e a estrutura administrativa da metrópole -e nos fazer metrópole.
Por que d. João -ou rei d. João 6º, a partir de 1816, quando sua mãe, a rainha d. Maria 1ª, morreu- foi tão maltratado por nossos historiadores? Porque, durante o século 19, a proximidade dos fatos não permitia uma perspectiva adequada. Além disso, a historiografia brasileira era quase uma extensão da portuguesa, e os historiadores lusos nunca perdoaram d. João por ter "fugido" para o Brasil.
De 1889 em diante, com a República, tudo que viesse da Monarquia tinha de ser diminuído, e cristalizou-se uma imagem negativa de d. João. A exceção foi Oliveira Lima, com seu definitivo "D. João 6º no Brasil", de 1909. Não por acaso, ele era malvisto como "monarquista".
A principal fonte dos ataques a d. João foi "A Corte de d. João no Rio de Janeiro", do popularíssimo Luiz Edmundo, publicado em 1937 -poucos exerceram a lusofobia com tal maestria da língua portuguesa. Edmundo leva 656 páginas descrevendo um d. João ridículo, repulsivo, flatulento e, no máximo, digno de dó. Pois foi essa a imagem que ficou e que, há tempos, se levou levianamente para o cinema. Por Edmundo, o Rio e o Brasil seriam franceses.
Mas isso pode mudar. O material produzido nos últimos meses pelos 200 anos da chegada da corte já tem uma vantagem: a de trazer d. João para uma perspectiva mais justa e verdadeira, ao alcance da nossa gratidão.


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