|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ROBERTO MANGABEIRA UNGER
Os aparelhos e o ar
LUTAM NO país duas idéias a
respeito das condições macroeconômicas de novo modelo de crescimento econômico. Uma
dessas idéias conta com cada vez
menos aderentes; só a abraçam
com entusiasmo os beneficiários
do rentismo financeiro. Outros
continuam a render-lhe homenagens apenas por não ver com clareza a alternativa ou por temer os riscos da travessia. A idéia contrastante é o objeto obscuro do desejo
nacional. Seu problema é que ainda
não conseguiu expressar-se em estratégia clara. Envolta em brumas,
acaba parecendo mais difícil e arriscada do que de fato é.
De acordo com a primeira idéia,
que continua a reinar por causa do
interesse de alguns e da desorientação de muitos, o câmbio valorizado seria conseqüência natural de
nosso próprio êxito, bem como do
juro alto. E o juro alto seria efeito
inescapável de um passado de irresponsabilidade e de um presente
de desconfiança nas finanças públicas. Desconfiança provocada
por inveterado malogro na contenção do gasto público. O resultado,
porém, não seria de todo ruim. Para sobreviver no ambiente hostil,
dizem, precisam as empresas tornar-se mais eficientes. Falta oxigênio. Têm de aumentar capacidade
pulmonar. Para as mais ofegantes,
permite-se o uso de aparelhos (desonerações tributárias pontuais).
Errado. Sobrepõe os interesses
de grandes empresas estabelecidas, que se podem socorrer de financiamento próprio ou internacional, aos interesses dos empreendimentos emergentes, que
representam a força maior de nossa economia. E desconsidera a tarefa prioritária da política industrial. Não é escolher os setores que
devam prosperar. É contrabalançar, de um modo que respeite o imperativo da concorrência e que ajude a provocar o fervor de empreender, as inibições características do
subdesenvolvimento.
Aí está o ponto de partida da outra idéia. Usar os poderes e os recursos do Estado não para dirigir
ou suprimir os mercados, mas para
tomar iniciativas que dêem a mais
gente mais acesso a mais mercados
de mais maneiras. E combinar o incentivo ao espírito empreendedor
com aquilo que o populismo e o estatismo econômicos costumam suprimir: o aguçamento da concorrência. À fecundidade empreendedora deve seguir-se o mecanismo
seletivo da competição. Essa seqüência é a fórmula do êxito.
Nada disso providencia solução
fácil para os problemas conjugados
do juro e do câmbio. Reforça, porém, as razões de nossa inconformidade. Comodismo fatalista, nesse campo como em outros, será ruinoso para o Brasil. Tragam o oxigênio, não nos aparelhos, mas no ar.
www.robertounger.net
ROBERTO MANGABEIRA UNGER escreve às
terças-feiras nesta coluna.
Texto Anterior: Rio de Janeiro - Carlos Heitor Cony: "Brasília" é um sucesso Próximo Texto: Frases
Índice
|