São Paulo, sábado, 10 de maio de 2008

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Uma outra matriz

Avanço da cana em 2007 aumentou uso de fontes renováveis de energia, mas benefício ambiental pode ser anulado à frente

A VARIAÇÃO na matriz energética nacional, de um ano para o outro, não permite extrair conclusões firmes ou definitivas, pois a entrada em operação de um só empreendimento, como uma usina elétrica de grande porte, pode alterá-la de modo significativo. Ainda assim, o comparativo 2007/2006 chama a atenção por um notável crescimento de fontes renováveis de energia, como a hidreletricidade e a queima de biomassa.
Na média mundial, 87,3% da energia primária (toda a energia injetada na economia, antes de ser transformada ou consumida) vem de fontes não-renováveis. Em geral, dos chamados combustíveis fósseis (petróleo, gás natural e carvão mineral), que agravam o aquecimento global.
O Brasil já se encontrava numa posição ímpar, com 44,9% de fontes renováveis em 2006. Agora, passa a 46,4%. Isso é bom para o clima do planeta, mas também para o país, que diminui relativamente sua dependência de recursos fadados a se esgotar.
O avanço se deve sobretudo à energia obtida da cana-de-açúcar. Na forma de álcool combustível ou de bagaço, ela se expandiu 17,1% em 2007 e teve sua fatia na matriz ampliada de 14,5% para 16%. Em contrapartida, decresceu a parcela representada por petróleo e derivados -graças aos veículos flex, que deram ao consumidor a segurança de não ficarem expostos às flutuações no preço e na oferta do álcool.
Registrou-se uma taxa de aumento de demanda de energia primária (5,9%) maior que a do PIB (5,4%), como é usual nas economias em desenvolvimento. Do ponto de vista da eficiência e do ambiente, o ideal é que a intensidade energética da produção se reduza. No caso brasileiro, isso já se observa no âmbito mais restrito da oferta de energia elétrica, que cresceu só 4,9%.
Melhor ainda: aí também se observou um aumento das fontes renováveis, que já predominavam. Acompanhando a expansão da cana, a geração elétrica por queima de biomassa teve um dos maiores acréscimos (7,9%), seguida pela hidráulica (6,5%).
Embora a fatia das fontes não-renováveis de eletricidade tenha diminuído, é digno de nota o avanço de 10,4% do carvão mineral na geração de termeletricidade, em detrimento do gás natural. Entre os combustíveis fósseis, o carvão figura como o mais poluente e danoso para o clima.
De resto, o próprio planejamento federal prevê que a matriz elétrica se torne mais "suja" até 2030. Seria quase duplicada a participação do carvão na geração termelétrica (de 8% para 15%), enquanto recuaria a de hidrelétricas na eletricidade total (de 90% para 78%). As boas notícias de 2007, assim, parecem ter os dias contados.
Também se recomenda comedimento no entusiasmo com a cana e o álcool. Se até o presente não conduziram à destruição comprovada de ecossistemas, sua expansão futura poderá acarretar esse efeito adverso. Uma razão a mais para acelerar os trabalhos de zoneamento ecológico-econômico em todo o país, em especial nas áreas de cerrado e de floresta amazônica.


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