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São Paulo, terça-feira, 10 de junho de 2003

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CLÓVIS ROSSI

A lógica da desesperança

SÃO PAULO - É, obviamente, cedo para abandonar toda e qualquer esperança em relação ao futuro do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Mas é difícil encontrar argumentos racionais para rebater a desesperança exposta pelo filósofo Paulo Arantes, em debate na quinta-feira, relatado num belo trabalho de Rafael Cariello para a Folha de domingo.
"Uma vez adotada a atual política macroeconômica, que não é especificamente brasileira, mas mundial, a saída é uma impossibilidade lógica", disparou Arantes.
Tem razão. Se ele me permite ser menos filósofo e mais primário no raciocínio, o que ocorre é a "piranhização" do governo Lula. Funciona assim: deixadas cair no rio as primeiras gotas de sangue para aplacar a fúria das piranhas do mercado, depois não é mais possível deixar de saciar o apetite delas, sob pena de uma terrível vingança.
A vingança pode até tardar um pouco, mas virá, inexorável, no primeiro momento em que o governo tentar colocar um entrave qualquer à liberdade dos capitais para se movimentarem e buscarem o maior lucro possível no menor tempo possível e com o menor risco possível.
A "impossibilidade lógica" de que fala Arantes está dada pelo fato de que ganhar credibilidade aos olhos do mercado não é um fenômeno que tenha começo, meio e fim.
Todo santo dia é preciso ajoelhar e rezar aos mercados (ou beijar a cruz, para usar a expressão do filósofo).
Não há hipótese de graduação. O aluno (governo Lula) estará todo santo dia sob exame das piranhas, e a nota é dada não pela ação em favor do país, mas pela capacidade de continuar saciando a sede de sangue.
Basta lembrar o que sofreu -por decisão própria, é verdade- um governo como o de FHC, em tese mais pró-mercado do que o de Lula. Supor que agora será diferente, que o Fome Zero comoverá os agentes financeiros, é acreditar em Papai Noel.


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