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O TSE se desgasta
Pouco importa se a mudança vem ou não de interpretações da lei: se descumpre a anualidade, não deve ser aplicada
NA TERÇA-FEIRA , seis
ministros do Tribunal
Superior Eleitoral, liderados pelo presidente da corte, Marco Aurélio
Mello, decidiram aplicar a ferro e
fogo a verticalização das alianças
partidárias. Menos de 48 horas
depois, os mesmos magistrados,
também capitaneados pelo presidente, voltaram atrás. Restabeleceram as regras de 2002, mas
não evitaram o desgaste do TSE.
Um sistema eleitoral que obedece ao princípio da anualidade
(art. 16 da Constituição) simplesmente não pode alterar as regras
do jogo eleitoral quando faltam
menos de 365 dias para o pleito.
Não importa se as mudanças venham na forma de lei aprovada
pelo Congresso ou de interpretações da lei pelo TSE que modifiquem de fato o "statu quo": se
desrespeitam a anualidade, sua
aplicação imediata deve ser rechaçada, no caso de diplomas, e
evitada, no caso dos juízes.
Em 2002, o TSE passou por cima do princípio ao instituir, a sete meses do escrutínio, a verticalização, restrição às alianças partidárias que não estava expressa
em lei nenhuma e que não havia
sido aplicada em 1998 -as eleições de 1998 e 2002 foram regidas pela mesma lei, que também
está regulando o ciclo de 2006.
Na terça-feira passada, a corte
ameaçou fazer o mesmo, proibindo legendas sem candidato à
Presidência de se coligarem, nos
Estados, com siglas que participem do concurso ao Planalto.
Tratava-se, na prática, de uma
inovação radical em relação ao
que valeu na eleição anterior,
quando os partidos sem candidato a presidente ficaram livres para aliar-se a quem desejassem
nos pleitos estaduais. A novidade, se tivesse ido à frente, entraria em vigor a dias das convenções partidárias e a menos de
quatro meses do escrutínio.
Menos mal, dado o primeiro
passo em falso, que a corte tenha
restabelecido o ambiente regulatório anterior no que diz respeito
às alianças. O que fica difícil de
entender é por que o colegiado
tomou a primeira decisão de restringir em grau inédito as possibilidades de coligações partidárias. Permitiu-se alterar as regras a menos de um ano do pleito
mesmo tendo o Supremo Tribunal Federal, em 23 de março, defendido corretamente a anualidade contra a emenda que acabava com a verticalização, postergando sua aplicação para 2010.
Custa crer que homens públicos experientes como os ministros da corte eleitoral não tenham conseguido projetar o impacto profundo que teria a sua
interpretação de terça-feira no
ambiente eleitoral. Infelizmente, fica a impressão de que os magistrados quiseram mesmo endurecer as regras das alianças -o
que contradizia a anualidade-,
mas acabaram se dobrando à
imensa pressão do dia seguinte,
da parte dos partidos políticos.
Desfechos como esse nunca
são bons para a imagem de um
órgão cujo papel é arbitrar eleições com autonomia. O desgaste,
que tampouco faz bem à democracia, poderia ter sido evitado se
a decisão de terça-feira tivesse
levado em conta a anualidade, o
que se espera que ocorra daqui
por diante sempre que esse tipo
de questão estiver em pauta.
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