São Paulo, quarta-feira, 10 de junho de 2009

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A forma da recessão


Queda do PIB se abranda, mas, sem retomada externa, será difícil que o Brasil volte a registrar expansão considerável

DENTRE OS cacoetes dos economistas, entrou na moda, por conta da crise global, a tentativa de adivinhar o "formato" da recessão. Com que se parecerão os gráficos representando a produção econômica durante este ciclo de desalento quando ele já estiver encerrado?
Os pessimistas invocam o exemplo do Japão da década de 1990 e vaticinam uma trajetória em "L" para as economias desenvolvidas: um mergulho, seguido de longo período de pasmaceira. Já os partidários do "V" ficaram esperançosos com a divulgação, ontem, do PIB brasileiro do primeiro trimestre.
Os dados do IBGE mostram nítida desaceleração na curva descendente, no cotejo com o período imediatamente anterior. A produção, que caíra 3,6%, ou -13,6% anualizados, nos últimos 90 dias de 2008, experimentou declínio bem mais moderado a seguir. A queda de 0,8% -cerca de -3%, na medição anualizada- foi menor do que antecipava a maioria das previsões.
A divulgação bastou para o ministro da Fazenda, Guido Mantega, desfraldar a bandeira do otimismo. "Há um descolamento da crise", pontificou. Não é isso que a pesquisa mostra.
Uma parte importante da economia brasileira foi severamente atingida. O volume de bens e serviços negociado com outros países levou um tombo de mais de 16% no início do ano.
A produção industrial, que já havia encurtado 8,2% no final de 2008, registrou outra queda importante (-3,1%), se bem que menor. Nessa mesma passagem, acentuou-se o declínio (de -9,3% para -12,6%) dos investimentos em máquinas e construção civil.
Ficou claro, entretanto, que foi limitado o espraiamento da crise além dos segmentos que atingiu com ímpeto, caso dos setores dedicados à exportação. O Brasil atravessa, em outras palavras, uma crise aguda na procura externa por seus produtos, mas uma desaceleração moderada da demanda doméstica.
O aumento dos gastos públicos nos últimos meses -ao lado da persistência dos gastos do consumidor brasileiro- é uma das principais explicações para esse fenômeno. A expansão da despesa oficial, contudo, não pode se repetir indefinidamente, sob o risco de produzir distorções que vão limitar o crescimento logo à frente.
Sem retomada externa, será difícil que o PIB do Brasil volte a registrar altas expressivas, como ocorria até setembro de 2008. É cedo para saber, assim, se a segunda perna deste ciclo comporá, de fato, uma letra "V".


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