São Paulo, sexta-feira, 10 de agosto de 2007

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Vício antigo

Como seus antecessores, de Sarney e Collor a FHC, Lula lança mão de verbas e cargos para submeter o Congresso ao Executivo

COMO SEMPRE na história deste país, o governo federal recorre ao testado e comprovado estratagema de liberar verbas e cargos para influenciar votações no Congresso. Trata-se de uma crônica distorção da democracia brasileira que Lula, na oposição, prometia corrigir. Mas seu governo, neste como em outros pontos, em nada inovou.
O Planalto empenhou R$ 67 milhões nos seis dias iniciais de agosto para aprovar a prorrogação da CPMF, mais de três vezes o total que havia sido liberado em sete meses. Até o valor é similar aos R$ 80 milhões que FHC pulverizou em maio de 2001 para evitar a CPI da Corrupção.
Militantes propensos a justificar os meios pelos fins poderiam alegar que no caso da CPMF se trata de uma necessidade. Decerto denunciariam como "golpista", hoje, uma propaganda política -mesmo se ideada por um Duda Mendonça- que associasse tal corrupção do processo parlamentar com a imagem de ratos roendo a bandeira do país.
Fernando Henrique acusou a campanha feita pelo PT na época de "nazista". A direção petista de então devolveu a pecha de "fascista", assim: "FHC é chefe de um governo que esteriliza o Legislativo, a poder de medidas provisórias, e que conduziu o país a uma fase de trevas".
Muitos adversários de Lula diriam que a frase se aplica bem ao atual governo. Nem por isso se qualificariam como oposição conseqüente, capaz de iniciar a erradicação do patrimonialismo que assola a política, aqui, desde que o Brasil era Portugal.
O líder do DEM, Onyx Lorenzoni (RS), confrontado com práticas equivalentes dos governos FHC integrados por seu partido, saiu-se com esta: "Estava errado lá e está errado agora". Nada indica que, se voltar ao poder, o ex-PFL agirá de modo diferente.
Tal constatação por certo não justifica a temporada de caça ao apoio político e de oferta de cargos aberta por Lula. Os R$ 67 milhões são só a ponta de um iceberg bilionário que o Planalto estaria prestes a dissolver sobre o Congresso. Também das verbas represadas do PAC se aguarda uma enchente neste semestre, destinada a irrigar o prestígio regional e local dos aliados, cujo apetite não se aplaca somente com recursos.
O Executivo federal entesourou um cobiçado acervo de cargos, cuja barganha por serviços parlamentares em áreas sensíveis foi intensificada. A nomeação prometida de Luiz Paulo Conde para a presidência de Furnas coincidiu não só com a retomada da tramitação da CPMF como também com a resistência da CPI do Apagão Aéreo -interinamente presidida pelo ex-rebelde Eduardo Cunha (PMDB-RJ)- a convocar depoimentos incômodos para o Planalto, notadamente o de Denise Abreu, diretora da Anac.
Lula dá uma contribuição importante, ainda que não inédita nem recordista (como talvez gostasse), para sujeitar o Congresso. Ao concentrar tudo na Presidência, acumula poder, mas também conflitos e a obrigação de arbitrar, coisa que a história, a teoria política e seu próprio retrospecto não recomendam.


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