|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
A venda da Telebrás
BORIS FAUSTO
A venda do Sistema Telebrás é um
acontecimento relevante que, intermitentemente, vai ocupar a atenção
da mídia e do público durante semanas, meses e anos.
Antes de examinar as projeções para
o futuro, vale a pena ressaltar um aspecto formal da venda. Realizada em
pleno ano eleitoral, a transação, de
enormes proporções, não gerou suspeitas e menos ainda acusações sérias
de favorecimento. Isso não é pouco,
em um país marcado pela corrupção,
tanto no nível do Estado quanto em
setores da sociedade.
Convém ressaltar de passagem que,
ao aludir a acusações sérias, deixo de
lado as lançadas pelo presidente do PT
e pelo candidato do partido, que não
passaram de palavras ao vento, levadas à conta de uma paixão partidária
irresponsável.
Descartada a discussão nesse terreno, convém lembrar que a venda das
estatais não representa uma unanimidade nacional. É explicável que assim
seja, não só porque a divergência de
rumos a seguir constitui o tecido de
uma sociedade que se quer democrática, como também porque a ideologia nacionalista foi um traço dominante de nossa história, desde 1930.
Rever essa ideologia representa um
considerável esforço, sobretudo se
considerarmos que ela esteve associada, em maior ou menor grau, ao que
se convencionou chamar de idéias
progressistas e ao pensamento de esquerda. Seja como for, depois de muita água ter corrido sob a ponte, considerar a venda dos serviços de telefonia
como "um crime de lesa-pátria", um
atentado à soberania, ou à segurança
nacional, soa como figura de retórica
eleitoral, com ressaibos de uma ideologia que imperou durante o regime
militar.
Mas nem por isso estamos navegando em um mar de rosas. Se os problemas e os desafios representados pelas
privatizações são outros, isso não
quer dizer que não sejam bastante sérios. Está em jogo, entre outras coisas,
a capacidade do Estado brasileiro de
exercer o novo papel que lhe vem sendo atribuído pelos objetivos da ação
governamental, no sentido de atuar
como agente regulador da economia e
não como agente econômico. Essa tarefa é particularmente relevante no
caso do Sistema Telebrás.
Não custa lembrar, pois há quem se
esqueça, que o objetivo básico da privatização é o de acabar com as imensas filas de espera por um simples telefone, melhorar a qualidade dos serviços e fixar tarifas ao alcance dos
usuários. Embora as metas tenham sido definidas contratualmente, a experiência demonstra que seu cumprimento depende da capacidade de
atuação eficaz das agências regulatórias -em primeiro lugar a Anatel-,
que precisam estar dotadas de instrumentos legais, possibilitando, se necessário for, a imposição de sanções a
empresas faltosas. A controvérsia que
se abriu nestes dias, em torno das
obrigações do consórcio vencedor do
leilão da Tele Norte Leste, é, aliás, um
exemplo revelador.
Se os esforços deste e de futuros governos caminharem na direção apontada, se uma oposição fiscalizadora
cumprir sua tarefa, o país terá dado
passos importantes no rumo da reformulação do papel do Estado e, sobretudo, no atendimento de uma necessidade da população.
Boris Fausto escreve às segundas-feiras nesta coluna.
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|