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CLÓVIS ROSSI
Os objetos
SÃO PAULO - Em 1989, logo após
ser derrotado por Fernando Collor
de Mello, Luiz Inácio Lula da Silva
desabafou entre amigos: "Êta povinho b...".
Agora, prestes a conseguir sua segunda vitória consecutiva em pleitos presidenciais, Luiz Inácio Lula
da Silva alça o "povinho", antes
"b...", à condição de santo e sábio.
E diz, com razão, que a oposição
quer mudar o povo para poder ganhar a eleição, o que é o mesmo que
dizer que, agora, quem acha o "povinho b..." é a oposição, a mesma que
santificava o povo quando elegia e
reelegia Fernando Henrique Cardoso.
Vamos ser honestos ao menos
uma vez na vida, vai, e reconhecer o
seguinte: o tal de povo não é "lulista", "fernandista" ou qualquer outro "ista". Afinal, derrotou Lula em
quatro de suas cinco tentativas de
conseguir emprego no Executivo
(uma para governador de São Paulo, em 1982, e três para a Presidência -1989, 1994 e 1998).
Deve ter tido, portanto, muito
mais motivos e ocasiões para desejar trocar o povo do que para santificá-lo como agora.
O eleitorado está, sim, "lulista"
agora, como foi "collorido" há 17
anos, sejam quais forem os motivos
que o levaram a tais escolhas.
O problema não é o tal de povo
ser santo, sábio ou "b...". O problema é ser eternamente objeto, e não
agente de sua própria história. O
problema é ser pobre demais, desarticulado e desorganizado demais, a ponto de precisar, eternamente, de alguém que se faça de
"pai" dele, de campeão dos desvalidos, que, não obstante, continuam
desvalidos depois que o "pai" deixa
de fingir que é pai, vai para o ostracismo ou morre.
O Brasil só será um país mais ou
menos decente na hora em que o tal
de povo puder falar por sua própria
voz, em vez de depender de intérpretes que ora o santificam, ora o
desprezam, na dependência de suas
fortunas eleitorais.
crossi@uol.com.br
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