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Castro em seu aquário
Com surpreendentes lances de autocrítica, o líder parece ter o objetivo de manter
sob controle o processo de abertura econômica em Cuba
Poderia fazer parte de algum romance do realismo fantástico latino-americano o relato que o jornalista Jeffrey Goldberg publicou, no
site da revista "The Atlantic", sobre seu encontro com Fidel Castro.
Aos 84 anos, o alquebrado líder
cubano não perdeu a capacidade
de atrair as atenções mundiais,
mesmo depois de ter entregue a
seu irmão Raúl o comando político do governo.
Sua entrevista com o repórter
americano veio cercada de circunstâncias insólitas. Um show
de golfinhos foi providenciado especialmente -era dia de folga dos
funcionários no aquário de Havana- para deleite da visita ilustre.
"Faça perguntas a ele sobre os
golfinhos", disse Castro ao jornalista, apresentando-lhe o diretor
do aquário. Logo depois, mudou
de ideia. "Na verdade ele não entende nada de golfinhos; é um físico nuclear".
Por que um físico estaria trabalhando ali? "Assim o impedimos
de construir bombas atômicas",
respondeu Castro num acesso de
riso. Chamou então uma veterinária, capaz de dar informações
mais precisas sobre os cetáceos;
era a filha de Che Guevara.
Foi, sem dúvida, o momento
mais surreal de três dias de encontro entre Fidel e o jornalista; não
foi, porém, o mais surpreendente.
O velho ditador tomou a iniciativa de condenar o antissemitismo
do presidente iraniano Mahmoud
Ahmadinejad, notório candidato
a sucedê-lo no posto de símbolo
máximo do antiamericanismo
global. As declarações que deu sobre o tema, diga-se de passagem,
poderiam ser lidas com proveito
por seus admiradores no Brasil.
Fidel Castro prosseguiu penitenciando-se de suas atitudes durante a crise dos mísseis, em 1962.
Na época, sugerira aos soviéticos
que desfechassem um ataque nuclear contra os EUA. "Sabendo do
que sei agora", disse Fidel, "isso
não teria valido a pena".
A verdadeira bomba, entretanto, viria depois. Perguntado se o
modelo cubano ainda deveria ser
exportado a outros países, "el comandante" respondeu: "nem para nós o modelo funciona mais".
Fosse para imitar o humor bizarro de alguns escritores latino-americanos, seria o caso de dizer
que enquanto os golfinhos davam
suas piruetas no aquário de Havana, com velocidade ainda mais
vertiginosa Che Guevara haveria
de estar revirando-se na tumba. E,
como diz uma antiga "boutade", o
próprio Fidel Castro teria se revirado também -não fosse o fato de
estar vivo.
Vivíssimo, aliás. Menos do que
a um natural abrandamento da
têmpera na idade avançada, pode-se atribuir a atitude de Castro
ao interesse em manter a estrutura
de poder implantada em Cuba.
O exemplo da China ilustra a
possibilidade de se preservar uma
ditadura de partido único num
sistema de capitalismo de Estado.
As mensagens de Fidel visam a facilitar, sem dúvida, a retomada
dos investimentos americanos em
Cuba -e a evitar que a condução
do processo de abertura na ilha fuja do controle do castrismo.
Como o aquário de Havana, a
economia e a política abrirão (parece dizer Fidel) no dia em que julgarmos conveniente.
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