UOL




São Paulo, sexta-feira, 10 de outubro de 2003

Próximo Texto | Índice

EUFORIA

Seria prudente que o país não se deixasse ofuscar pelo brilho da atual euforia dos mercados financeiros. Não se trata de ignorar os avanços obtidos e os efeitos positivos da recente melhoria na percepção do país. Como se sabe, a perspectiva de uma vitória eleitoral do PT agravou as incertezas quanto aos compromissos a serem saldados e provocou forte desconfiança em relação ao Brasil, resultando em elevação das avaliações de risco, da cotação do dólar e, consequentemente, da inflação. Passados, porém, nove meses de governo, a política implementada parece recobrar a confiança dos mercados financeiros, a despeito dos graves efeitos deletérios sobre a atividade produtiva e o emprego.
Quem nutria receios a respeito de "default", quebra de contratos, políticas populistas de gasto público e intervencionismo no Banco Central parece estar suficientemente seguro de que, longe de uma ruptura, o que está em curso é a continuidade da política anterior. Mais ainda, a continuidade renovada por um apoio político que já faltava à gestão passada.
Nesse cenário de "choque de credibilidade", com resultados vistos como auspiciosos pelos mercados, seria de esperar que o movimento de fuga fosse progressivamente revertido, propiciando uma retomada dos investimentos na Bolsa e em títulos brasileiros. Essa tendência vem sendo também impulsionada pelo quadro internacional, marcado pelas baixas taxas de juros praticadas na Europa, nos Estados Unidos e no Japão em contraste com as taxas oferecidas por papéis brasileiros.
Para que tudo isso se transformasse em euforia faltava, porém, uma surpresa favorável. Ela veio com a reclassificação da Rússia pela agência Moody's. O país, que decretara moratória em 1998, foi alçado ao "investment grade" -que indica pouquíssimo risco. A sinalização reforçou as apostas em mercados emergentes, entre os quais figura o Brasil.
Não há maior novidade em movimentos como esse. Por mais que possam ser avaliados positivamente, devem ser encarados como o que são: episódios da dinâmica volátil dos mercados financeiros, que podem ser desfeitos rapidamente. São inúmeros os exemplos de "bolhas" causadas por expectativas ou situações artificialmente produzidas e temporariamente sustentadas nos vorazes mercados globais.
Se há indicadores positivos a comemorar e se eles permitem que o Brasil volte a atrair a atenção de investidores financeiros, isso não deve servir para desviar a atenção do principal, ou seja, da chamada economia real. O que tem faltado ao Brasil nos últimos anos é justamente a capacidade de a economia se expandir de maneira mais expressiva e contínua, produzindo emprego e riqueza.
O verdadeiro desafio, portanto, está ainda por ser enfrentado: a criação das condições para uma trajetória de crescimento sustentado, com recuperação do investimento, eliminação de gargalos de infra-estrutura e abertura de postos de trabalho. É esse o tipo de "euforia" que os brasileiros estão esperando.


Próximo Texto: Editoriais: A FORMA DO UNIVERSO

Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.