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A FORMA DO UNIVERSO
No que teria sido uma das mais
importantes descobertas científicas dos últimos cem anos, astrofísicos afirmaram que o Universo é finito e tem a forma de uma bola de futebol (um dodecaedro). O "paper"
em que os pesquisadores anunciaram sua teoria, publicado na edição
de anteontem da revista "Nature",
não ficou muitas horas sem sofrer
forte contestação. Um outro grupo
de cientistas, que trabalha com os
mesmos dados da primeira equipe,
afirma estar concluindo um estudo
que descarta a hipótese do Universo
futebolístico, assim como a do Universo em forma de "rosquinha".
Ambos os grupos e vários outros
fazem seus cálculos e elaboram suas
teorias a partir de medições da radiação cósmica de fundo, isto é, a partir
de variações mínimas na temperatura das microondas que teriam se formado nos primórdios do Universo.
A idéia central é que as diferenças de
temperatura permitem estimar a
densidade do Cosmo e, a partir daí,
pode-se inferir sua extensão e forma.
Apesar de os instrumentos para
medir essa radiação estarem se sofisticando, seria precipitado apostar
desde já num modelo qualquer. Em
2000, os indícios apontavam para
um Universo plano e infinito. Agora,
parecem indicar um Cosmo fechado
(finito). Conjeturas sobre sua topologia (forma) são ainda mais problemáticas, como mostrou o caso e o
ocaso do Universo em forma de bola.
O bonito nas teorias cosmológicas
é que elas são ciência em estado bruto. Operam em escalas incompatíveis com qualquer propósito prático.
Não chega a ser confortador descobrir que, se caminhássemos à velocidade da luz numa direção, acabaríamos voltando ao ponto de partida, 74
bilhões de anos depois. Para os que
insistem em aplicações concretas,
um Cosmo fechado e curvo é compatível com viagens no tempo através
de atalhos dimensionais, que pressupõem um espaço retorcido.
Num sentido mais profundo, essas
teorias servem para pontuar a nossa
ignorância. É verdade que, nos últimos 80 anos, aprendemos mais sobre o Universo do que em qualquer
outro período. E nossas teorias já
não são puramente especulativas como o eram até o século 18. Elas agora
podem ser testadas empírica e matematicamente. Apesar desses notáveis avanços, todas nossas hipóteses
esbarram no Big Bang, a explosão
primordial que teria dado origem a
toda a matéria e energia existentes. O
Big Bang, que vem sobrevivendo relativamente intacto a todo tipo de
medição e cálculo, permanece como
uma singularidade além da qual não
nos é dado conhecer coisa alguma.
Em termos filosóficos, porém,
continua perfeitamente lícito perguntar pelo que havia antes ou em
volta do ponto de densidade infinita
que há uns 15 bilhões de anos "resolveu" explodir dando origem a tudo.
Essa singularidade, que tanto incomoda cosmólogos e filósofos, mas
conta com o apoio entusiasmado da
Igreja Católica (o Vaticano pronunciou-se favoravelmente ao Big Bang
já em 1951), é a um só tempo a grande descoberta e a grande barreira.
Num certo sentido, continuamos
tão ignorantes quanto o primeiro filósofo que se perguntou pela origem
de tudo ou o primeiro sacerdote que
inventou a primeira mitologia.
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