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Editoriais
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Tempos excepcionais
Com multinacionais gigantescas em apuros, governos passam a atuar no papel de acionista
em última instância
A LIQUIDAÇÃO violenta
nos mercados de ações
prosseguiu ontem,
apesar de todo o arsenal de medidas anunciadas e implementadas pelos governos na
tentativa de detê-la. O índice
Dow Jones, de Nova York, mergulhou 7,6% e voltou ao patamar
do início de 2003. É como se todo
o notável ciclo de expansão vivido pela economia dos EUA desde
então tivesse virado pó aos olhos
da principal Bolsa do planeta.
A venda alucinada de ações,
que ocorria com mais vigor nas
companhias do setor financeiro,
agora atinge gigantes do setor
produtivo americano, como a
Exxon e a General Motors. A rápida desvalorização do petróleo,
cuja cotação já se aproxima do
índice mais baixo em 12 meses,
explica a queda das companhias
energéticas -as quais acumularam, até o primeiro semestre
deste ano, alguns dos maiores lucros da história.
A debilidade do mercado de
automóveis nos EUA, abatido
pela escassez de crédito e pelo
desalento do consumo, contudo,
jamais poderia justificar a queda
de 87,5%, em um ano, nas ações
da segunda maior montadora do
mundo. A cotação da empresa
desceu ontem ao valor mais baixo desde a década de 1950.
General Motors e General
Electric são multinacionais centenárias, que se confundem com
a história do capitalismo nos
EUA. O grau de dificuldade que
enfrentam agora para sobrenadar é um exemplo cabal dos danos que um setor financeiro deixado à própria sorte pode causar
ao coração do sistema produtivo.
Quando for escrita a história
desta crise, serão estabelecidas
as fronteiras cruzadas pelos governos na tentativa de deter a
derrocada. Se o papel do BC como emprestador de recursos em
última instância ao sistema bancário foi absorvido, a duras penas, na década de 1930, agora está prestes a descortinar-se a ação
do Tesouro como acionista em
última instância. No momento
em que todos fogem das corporações, até das maiores, o governo
entra a fim de evitar o colapso.
A seu modo, os planos e as atitudes dos governos vão convergindo nessa direção. Compras
maciças de ações de instituições
financeiras com dinheiro público estão a caminho nos EUA, no
Reino Unido, na Espanha -e serão copiadas por outros países. É
possível, senão provável, que a
estratégia venha a ser estendida
para abarcar empresas produtivas, fora da alçada financeira.
São tempos excepcionais para
a economia mundial. A situação,
mais que justificar, obriga os governos a romper tabus em caráter emergencial e transitório. O
Brasil reconheceu, parcialmente, essa excepcionalidade. O BC
age com desenvoltura para injetar recursos que escasseiam entre os bancos e nos negócios com
o câmbio. Uma medida provisória já autorizou a autarquia a
comprar carteiras de crédito de
instituições em dificuldade.
É uma pena, porém, que ainda
subsistam argumentos, da parte
do BC, a favor da manutenção de
uma política de juros isolada, e
restritiva, num momento de grave e progressiva desagregação da
confiança nos negócios, fenômeno que não tem poupado o Brasil.
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