São Paulo, segunda-feira, 10 de novembro de 2008

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FERNANDO DE BARROS E SILVA

País dantesco

SÃO PAULO - Pode-se dizer, sem exagero, que o advogado de defesa de Daniel Dantas estava em casa na última quinta-feira. O cliente de Nélio Machado saiu da sessão do STF quase como um mártir do Estado de Direito -prova involuntária de que a linha entre um suposto Estado Policial e a velha impunidade de sempre é tênue, muito tênue.
O juiz Fausto De Sanctis, em contrapartida, foi achincalhado pela ampla maioria dos presentes. Mais do que o placar -9 a 1 a favor de Dantas-, o próprio julgamento do mérito da decisão que havia soltado o banqueiro acabou se convertendo em espetáculo público e exemplar de linchamento retórico do juiz.
Cezar Peluso chegou a sugerir que a conduta do magistrado fosse submetida ao crivo do Conselho Nacional de Justiça. De Sanctis foi posto sob suspeição pela defesa de Dantas. Quando o caso chegar ao STF pode-se imaginar o desfecho.
A cena suprema só não foi mais ostensiva do que a operação da PF na véspera contra o delegado Protógenes e agentes da Abin. A pretexto de investigar o vazamento de informações da Satiagraha, a polícia vasculhou casas e apreendeu computadores. Também violou sigilos telefônicos sem ordem judicial, como revelou este jornal, embora negue.
Onde tudo isso vai parar?
Lá atrás, quando quase todos incensavam o novo Eliot Ness, esta coluna criticou os atropelos da operação e disse que os abusos da PF iriam favorecer os investigados. Registrou ainda que o contrabando ideológico que contaminava aquele inquérito obtuso servia para justificar barbaridades, como o pedido de prisão da repórter da Folha.
Protógenes agora experimenta seus métodos na pele. Mas quem deve comemorar? As motivações do cerco ao delegado sugerem algo pior do que só uma guerra entre facções na PF. Não há mocinhos nem heróis nessa história dantesca e nebulosa. Há, sim, vilões e bandidos que irão se dar bem no final.
É bom por isso acompanhar os próximos capítulos do enredo com a trilha sonora de um famoso filme de Francis Ford Coppola.


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