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ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES
450 anos, progresso e a triste realidade
Para São Paulo, janeiro de 2004
será a marca dos seus 450 anos de
vida. É desnecessário ressaltar aqui o
papel da cidade na industrialização do
país, na expansão cultural e, hoje em
dia, na alavancagem do setor de serviços. São Paulo construiu muito.
Mas é exatamente o aproximar da
festa de aniversário que me traz à
mente a deterioração que ocorreu no
coração da capital. No passado, éramos mais pobres, sem dúvida. Mas a
cidade era mais limpa, mais bem organizada e a população era muito mais
respeitosa. As famílias podiam usufruir de suas facilidades -os parques
e jardins, os cinemas de higiene impecável, os cafés atraentes e até as lojas,
que, apesar de pequenas, cultivavam a
fidelidade dos consumidores, tratando-os com educação e cordialidade.
É claro que os tempos mudam. A vida é outra. Temos de conviver com a
nova realidade. Mas não me conformo com a inércia das autoridades em
relação ao número crescente dos assíduos moradores de rua em São Paulo.
Um estudo realizado pela Fundação
Instituto de Pesquisas Econômicas da
Universidade de São Paulo indicou
que, em três anos, eles aumentaram
20%.
Hoje, cerca de 10 mil pessoas vivem
sob os viadutos, dormem nas calçadas
e lavam roupa nos jardins, numa cena
deprimente e que nada tem a ver com
a capital do Estado mais rico da nação.
O número está longe de ser um flagelo. Será que nossas autoridades não
conseguem resolver os problemas que
afligem 10 mil pessoas em uma cidade
de 10 milhões de habitantes?
É claro que uma solução definitiva
depende de emprego, de educação, de
habitação etc. Mas não se pode querer
fazer o ótimo, pois essa é a melhor maneira de não se fazer o bom. Há muito
a ser feito no sentido de abrigar essas
pessoas temporariamente -mas isso
não basta- e de dar a elas algum treinamento atrelado a serviços públicos
e privados de emergência.
A maioria dos moradores de rua é
composta de homens de 26 a 55 anos.
Cerca de 85% estão nessa categoria. E
as crianças que ficam nas esquinas e
dormem nas calçadas? Tudo indica
que elas formem um grupo ainda menor -talvez umas 2.000 crianças, se
tanto. Repito a pergunta: será que nossas autoridades não conseguem dar
um amparo a esse irrisório punhado
de menores?
São Paulo poderia comemorar os
seus 450 anos de outra maneira. A cidade poderia estar mais limpa. Não se
admite tanta pichação nos prédios públicos e privados e tampouco o alastramento dos que perambulam pelas
ruas, praças e jardins.
Já está mais do que desgastada a tal
da vontade política. Penso que seja
hora de falar em responsabilidade governamental. Os impostos e taxas não
param de aumentar. Nesse campo, a
criatividade é imensa. Os cidadãos de
São Paulo têm o direito, portanto, de
demandar uma cidade mais digna.
Que a cidade de São Paulo nos dê
um exemplo de grandeza cultural, incentivando a formação de bons professores e fazendo com que a cultura
de nossa população seja motivo de orgulho de toda a nossa sociedade.
Antônio Ermírio de Moraes escreve aos domingos nesta coluna.
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