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ELIANE CANTANHÊDE
As voltas que a vida dá
BRASÍLIA - Nos anos 70, quando
o general Geisel impulsionava o desenvolvimento com a mão esquerda e freava as liberdades com a direita, o Itamaraty era um oásis de
abertura, que se manteve com João
Figueiredo, último dos generais.
Uma festa para diplomatas com
fama de geniozinhos e que, como
iria acontecer com jovens políticos
de esquerda na década seguinte,
eram chamados de "barbudinhos".
De cabeça, eram Ronaldo Sardenberg, que foi ministro de FHC e
acaba de ser nomeado por Lula para
presidir a Anatel (agência de telecomunicações), Bernardo Pericás, a
caminho de Cuba num momento
delicadíssimo, Roberto Abdenur,
que se aposentou no último dia 29
como embaixador em Washington,
a mais disputada da carreira, e Celso Amorim, atual chanceler.
Em meio às denúncias de tortura
e à guerra surda com a "linha dura"
militar, os barbudinhos viam Geisel
desbravar fronteiras ideológicas e
encantavam-se com a ousadia do
veterano Ítalo Zappa, seu empenho
pela independência de Angola e, na
seqüência, pela aproximação com
Cuba e com a China. Um embaixador que fez história.
Era a política externa do "pragmatismo responsável" ou "terceiro-mundista", e os barbudinhos não se
cansavam de aplaudir quando o velho general batia na mesa contra os
EUA. Rompeu o acordo militar Brasil-EUA, virou uma fera com a pressão do governo Carter pelos direitos humanos no Brasil -""uma
questão interna".
Pois, hoje, Roberto Abdenur sai
de sua decantada discrição para
apontar "antiamericanismo" na política externa e amplificar o bumbo
contra o Itamaraty de seu amigo de
décadas Celso Amorim.
E a gente fica sem entender que
raios é antiamericanismo, se é uma
doença da direita de Geisel e da esquerda de Amorim ou, simplesmente, o legítimo desejo de independência e altivez diante da potência mais próxima -agora única.
eliane@2uol.com.br
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