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TENDÊNCIAS/DEBATES
Autoritarismo e fragmentação da educação
CÉSAR A. MINTO, MAURO A. P. DIAS DA SILVA e MILTON V. DO PRADO JÚNIOR
No que se refere às universidades públicas, ressaltam as medidas destinadas a intervir na sua autonomia
O NOVO governo do Estado de
São Paulo tem surpreendido a
sociedade, desde o primeiro
dia de mandato, com um conjunto de
decretos que, no mínimo, causam
apreensão, sobretudo por centralizar
ainda mais o poder no Executivo, em
movimento contrário ao ideal de um
Estado democrático de Direito.
No que se refere às universidades
públicas, ressaltam as medidas destinadas a intervir na autonomia universitária. Abordamos aqui cinco desses
decretos.
O decreto nº 51.460 (1º/1) causa
maior fragmentação da área: a educação básica (educação infantil, ensinos
fundamental e médio) fica na Secretaria da Educação; o Centro Paula
Souza (Ceeteps) é desmembrado da
Unesp (Universidade Estadual Paulista) e vinculado à Secretaria de Desenvolvimento (onde também foi alocada a Fapesp -Fundação de Amparo
à Pesquisa); e a educação superior vai
para a recém-criada Secretaria de Ensino Superior.
Nada mais emblemático, pois revela a opção de nem sequer criar um sistema de educação superior -aliás, até
ignora que o Ceeteps realiza ensino
superior (o tecnológico).
O decreto nº 51.461 (1º/1), que organiza a Secretaria de Ensino Superior,
preocupa tanto pelo que diz quanto
pelo que omite.
Ao definir seu "campo funcional",
enfatiza a "pesquisa operacional"
(aplicada), sem nenhuma referência à
pesquisa básica ou à indissociabilidade de ensino, pesquisa e extensão
-tripé que caracteriza as universidades. Ressalta a formação tecnológica,
mas não se preocupa com a formação
ampla, aquela com vistas "ao pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e
sua qualificação para o trabalho",
conforme a LDB. Não trata do financiamento desse ensino nem dos problemas causados por sucessivos governos: insuficiência de recursos;
mistura ilegítima de contas: desconto
da habitação antes do repasse do
ICMS às universidades, recolhimento previdenciário à custa da educação
ativa, dentre outros.
O decreto nº 51.471 (2/1) veda, por
tempo indeterminado, a admissão ou
contratação no âmbito do Estado,
centralizando-as por meio da Secretaria de Gestão Pública. Tal atitude,
aliada à exigência de cadastramento
dos servidores (desconfia dos antecessores?), aponta para um "enxugamento da máquina" que pode resultar
em maior privatização dos serviços
públicos essenciais, assim como em
maior precarização e terceirização do
trabalho.
O decreto nº 51.636 (9/3) obriga as
universidades a ingressar no Siafem/
SP (Sistema Integrado de Administração Financeira para Estado e Municípios), ignorando que elas dispõem
de sistemas autônomos de gestão de
recursos e que prestam contas diretamente ao Tribunal de Contas do Estado. Tal medida castra -em definitivo- a autonomia das universidades
estaduais paulistas, garantida no artigo 207 da Constituição Federal.
O decreto nº 51.660 (14/3) institui a
Comissão de Política Salarial (CPS),
composta pelos secretários da Fazenda, de Economia e Planejamento, de
Gestão Pública, do Emprego e Relações do Trabalho e o procurador-geral do Estado. Estabelece que a CPS
defina as diretrizes de política salarial
e que a Secretaria de Gestão Pública
conduza as negociações salariais com
as entidades dos servidores da administração direta e das autarquias (caso das universidades).
Assim, as negociações antes realizadas entre o Fórum das Seis (que
congrega entidades representativas
de docentes, funcionários técnico-administrativos e estudantes das três
universidades estaduais e do Ceeteps) e o Cruesp (Conselho dos Reitores das Universidades do Estado de
São Paulo) terão que ser submetidas à
Secretaria de Gestão Pública.
Tal cenário agrava-se devido à
constante isenção fiscal concedida
pelo Executivo e à freqüente sonegação fiscal não combatida a contento
pelos poderes públicos. Tudo isso
sem esquecer que Lembo/Serra vetaram na LDO para 2007 o acréscimo
de mísero 1% da receita de impostos
para a educação pública em geral no
Estado de São Paulo.
Diante das tendências fortemente
centralizadoras do governo do Estado, o mínimo que a sociedade pode
esperar é que o Legislativo faça prevalecer sua independência ante o Executivo e que os reitores assumam a
autonomia constitucionalmente outorgada às universidades.
CÉSAR AUGUSTO MINTO, 57, professor doutor da Faculdade de Educação da USP, é presidente da Adusp (Associação dos Docentes da USP). MAURO ANTÔNIO PIRES DIAS DA SILVA, 56, professor doutor da Faculdade de
Ciências Médicas da Unicamp, é presidente da Adunicamp
(Associação dos Docentes da Unicamp). MILTON VIEIRA DO PRADO JÚNIOR, 39, professor doutor da Faculdade de Ciências da Unesp (Bauru), é presidente da Adunesp (Associação dos Docentes da Unesp).
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