São Paulo, terça-feira, 11 de maio de 2010

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TENDÊNCIAS/DEBATES

A saúde também pode mais

RENILSON REHEM DE SOUZA


As conquistas do SUS não podem ficar à mercê da incerteza e da falta de comprometimento de governantes com esta causa


BANDEIRAS políticas ou partidárias não combinam com a saúde pública e os inúmeros desafios de uma área tão complexa, que impacta diretamente na qualidade de vida de todos os brasileiros.
Isso é premissa básica para que as ações sejam pautadas única e exclusivamente em benefício dos cidadãos, em vez de atender a outros interesses.
Defender a saúde fora do escopo partidário, entretanto, não significa isentar-se de escolher um lado.
É fato que a saúde, no Brasil, avançou de forma sem precedentes nas últimas duas décadas, com a aprovação constitucional e implantação do SUS (Sistema Único de Saúde).
Hoje, o Brasil é o segundo maior transplantador de órgãos do mundo, tem o maior programa de imunização em massa entre todos os países, erradicou doenças como paralisia infantil e o sarampo, possui um programa de controle da Aids reconhecido como exemplar pela OMS (Organização Mundial de Saúde) e desenvolve um bem-sucedido Programa de Saúde da Família, iniciado na década passada.
A ampliação do Programa de Saúde da Família, a proibição da propaganda de cigarros e de eventos ligados à indústria do tabaco, a introdução de um Programa de Dispensação de Medicamentos Excepcionais, para doenças raras e crônicas ,e o fortalecimento da parceria com as Santas Casas e hospitais beneficentes, por meio de incentivos especiais, conforme critérios de produtividade e eficiência, são algumas das conquistas de extrema relevância para a consolidação do SUS na década passada.
Do mesmo modo, o Brasil obteve enorme avanço ao aprovar a lei dos medicamentos genéricos, com grande benefício para a população, por ter ampliado o acesso a remédios nas farmácias em razão da redução nos preços, bem como ao introduzir o programa Bolsa Alimentação para combater a mortalidade infantil e a desnutrição, especialmente no Nordeste.
Mas a saúde pode mais, muito mais.
E o debate passa pela escolha de um projeto nacional alinhado com as necessidades de fortalecimento do SUS, da ampliação do acesso e melhoria da assistência na prestação de serviços de saúde, da descentralização da gestão, da construção de redes assistenciais regionalizadas e hierarquizadas e do aperfeiçoamento e criação de novas políticas públicas para o setor.
Em outras palavras, as conquistas do SUS não podem ficar à mercê da incerteza, da falta de comprometimento de alguns governantes com esta importante causa ou da contaminação ideológica e político-partidária que interrompe projetos bem-sucedidos implantados por governos antecessores, em prejuízo de milhares de cidadãos que deles se beneficiaram.
Desde 2000, uma emenda constitucional estipula percentuais mínimos sobre o Orçamento de cada esfera de governo a serem gastos com saúde.
Mas, por falta de empenho do atual presidente e de seus ministros, Estados, municípios e a própria União continuam jogando com os números em seus balanços para mostrar, na teoria, o que, na prática, não aplicaram na área da saúde.
Ao tratar a regulamentação da emenda constitucional nº 29 sob o espectro partidário, uma vez que a aprovação do projeto foi obtida pela gestão anterior, o governo Lula deixou milhares de brasileiros sem assistência adequada em saúde.
Do mesmo modo, o atual governo interrompeu os mutirões de saúde, que ampliaram a oferta de cirurgias eletivas para catarata, retinopatia diabética, varizes e próstata.
Quem não se lembra de notícias veiculadas pela grande mídia, de pacientes do SUS sendo levados para operações de catarata na Venezuela após o fim dos mutirões?
Na saúde, o que está dando certo deve continuar e ser aperfeiçoado.
Algumas das causas que defendemos como prioritárias para o fortalecimento do SUS em todo o país são a expansão da produção de medicamentos genéricos e a ampliação da assistência farmacêutica, pela revisão e atualização sistemática da cesta de medicamentos oferecidos.
Outras prioridades são o incentivo ao modelo de parceria com o terceiro setor, para profissionalizar a gestão de hospitais públicos, e proporcionar maior resolutividade ao atendimento ambulatorial com implantação de unidades de alta resolutividade.
É justamente em defesa do debate suprapartidário em torno da saúde pública que lançamos, no último dia 27 de abril, o Movimento Brasil Saúde, em Brasília, para promover um novo salto de qualidade na gestão do SUS e melhorar a vida das pessoas.


RENILSON REHEM DE SOUZA é médico. Foi secretário-adjunto de Estado da Saúde de São Paulo (2007-2008) e secretário de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde (governo Fernando Henrique).

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br

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