São Paulo, quarta-feira, 11 de agosto de 2004

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ANTONIO DELFIM NETTO

A inimportância do Copom

A ata do Copom relativa à reunião dos dias 20 e 21 de julho é muito interessante e fundamental para o entendimento da política monetária realizada pelo Banco Central. Como de costume, é necessário um "caveat emptor": cada um compra, a seu próprio risco, a idéia de que a taxa de juro de curto prazo controlada pela Selic produz modificações na curva da taxa de juros de longo prazo (DI futuro/ Swaps 360) e que esta controla o consumo, o nível de investimento e o PIB.
A taxa Selic só tem importância para a dívida do governo a ela indexada. O setor privado olha a Selic apenas para reclamar contra o "spread" que paga ao sistema financeiro. Em junho deste ano, as taxas médias de juros anuais pagos pelo setor privado ao sistema financeiro foram as seguintes




Essas taxas têm declinado muito lentamente, a despeito de todas as promessas do Banco Central. É claro que elas dependem da "imensa carga fiscal", dos ressuscitados "depósitos compulsórios", do nível de inadimplência etc. Mas dependem também do grau de concentração que se criou no setor financeiro. O Brasil tem um sistema financeiro inadequado, que fornece ao setor privado como crédito menos de 30% do PIB. Outros tantos são fornecidos pela indústria e, principalmente, pelo comércio, de forma extremamente ineficiente (do ponto de vista da economia nacional) e custosa (do ponto de vista do consumidor do crédito). Nada se tem feito a respeito. O pior é que a ata nos informa que, de acordo com o modelo do Banco Central, o "spread" deve crescer em 2005.
A ata mostra com clareza que temos no Copom um grupo de "falcões" que comanda a política monetária na base da evolução das "expectativas" e que crê que a taxa de juros real de equilíbrio seja de 10%. Como as primeiras se deterioraram recentemente, esses "falcões" nos informaram que a taxa Selic de 16% está aí para ficar "por um prolongado período de tempo". A meta de inflação buscada para 2004 é de 5,5%, enquanto as "expectativas" do mercado andam a 7,1% e a 6,3% para os próximos doze meses. A esperança do Banco Central é que a dureza da sua ameaça (se for necessário, "estamos prontos para agir", isto é, elevar a Selic) faça a "expectativa" convergir para 5,5% em 2004 e para 4,5% em 2005.
Por outro lado, é evidente que estamos dançando um tango "endógeno de pé quebrado": os informantes das "expectativas" determinam os resultados semanais da Gerin, que, na semana seguinte, influenciam os informantes. O Copom crê nas expectativas (que em parte ele mesmo cria) e manipula a Selic esperando modificar as "expectativas" dos informantes. Mas quem garante que os "preços livres" irão convergir, necessariamente, para atendê-las diante da magnitude dos preços contratados? Não cremos que a manutenção da Selic tenha maior efeito sobre o nível de atividade, mas será muito custosa para a dívida pública a ela indexada.

Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras nesta coluna.
dep.delfimnetto@camara.gov.br


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