São Paulo, quinta-feira, 11 de agosto de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

TENDÊNCIAS/DEBATES

A superburocracia da Receita

GUILHERME AFIF DOMINGOS

O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, editou no último dia 22 a medida provisória 258, que dispõe sobre a administração tributária federal e também estabelece a mudança do nome da Secretaria da Receita Federal, que passa a se chamar Receita Federal do Brasil, além de incorporar a Secretaria da Receita Previdenciária do Ministério da Previdência Social.
Cria-se assim, por medida provisória, a supersecretaria da receita. Se a matéria tratada pela MP 258 apresenta as características de relevância, mas não de urgência -exatamente por ser relevante-, deveria ter sido tratada por meio do encaminhamento de projeto de lei ao Congresso Nacional.


No caso da MP 258, infelizmente prevaleceu o autoritarismo que tem caracterizado a atuação do governo na área fiscal


A fusão de órgãos públicos importantes se reveste de grande complexidade do ponto de vista administrativo. Isso porque vai integrar o quadro de servidores de ambos os órgãos, embora eles possuam diferentes formações, regras de carreiras e mesmo culturas. Tal fusão pode gerar aumento de custos, uma vez que as equiparações deverão se fazer pelos valores maiores. Igual complexidade se observa no tocante aos aspectos operacionais, que envolvem unificação de cadastros, de normas burocráticas e de controles para compatibilizá-los e eliminar superposições.
Para que esses aspectos e outros pudessem ser debatidos, seria necessário que um projeto de lei fosse encaminhado ao Congresso Nacional acompanhado de estudos que demonstrassem os objetivos visados, a forma e os efeitos da integração das duas burocracias, o cronograma da implantação e os resultados esperados em termos de ganhos de eficiência. Seria necessário demonstrar o impacto dessa fusão para os contribuintes, para que se pudesse evitar que a medida viesse a representar mais burocracia e custos, além de maior insegurança para os pagadores de impostos.
A implantação do novo órgão deveria se fazer de forma gradativa e somente após a reorganização da Secretaria da Receita Federal, para que ela pudesse dar aos contribuintes o atendimento a que têm direito.
Atualmente, muitas empresas e muitos cidadãos foram inscritos como devedores da Receita em virtude de diferenças de valores. Quando procuram acertar a situação ou necessitam de certidão negativa, são submetidos a um tratamento humilhante, tendo que enfrentar filas desde a madrugada.
No que se refere ao INSS, basta considerar que nos últimos 11 anos tivemos 400 dias de greve, dado suficiente para avaliar os inúmeros problemas decorrentes enfrentados pelos contribuintes.
No caso da MP 258, infelizmente prevaleceu o autoritarismo que tem caracterizado a atuação do governo na área fiscal, que se imaginava superado após a ampla rejeição da MP 232 por toda a sociedade. O que parece orientar a criação dessa superburocracia é a busca do aumento da arrecadação federal, sem qualquer outra consideração sobre os efeitos da medida para os servidores públicos dos órgãos afetados e, principalmente, sobre os contribuintes.
A fusão da Secretaria da Receita Federal e da Secretaria da Receita Previdenciária poderia ser uma boa iniciativa se visasse dar mais eficiência à máquina arrecadadora, reduzindo custos do governo e, ao mesmo tempo, diminuindo a burocracia, com a eliminação de formulários e controles exigidos das empresas e um atendimento mais ágil aos contribuintes. Como, porém, parece que o objetivo é apenas o de arrecadar mais, sem quaisquer outras considerações, constitui um risco para empresas e cidadãos.
A receita do governo federal tem crescido muito acima da expansão da economia brasileira, aumentando a drenagem de recursos do setor privado para sustentar um gasto público de baixa qualidade e sem controle, como se vem observando pelos fatos noticiados nas últimas semanas.
Precisamos com urgência é da criação de uma supersecretaria da despesa, que se destine a cortar e racionalizar os gastos do governo, fazendo com que possa ser diminuído o déficit público e, com isso, as taxas de juros e a dívida, para aumentar os investimentos, a renda e o emprego.

Guilherme Afif Domingos, 61, empresário, é presidente da Facesp (Federação das Associações Comerciais do Estado de São Paulo) e da ACSP (Associação Comercial de São Paulo). Foi deputado federal pelo PL-SP (1987-91) e candidato do partido à Presidência da República em 1989.


Texto Anterior: Frases

Próximo Texto: Augusto de Franco: Salvando o governo do naufrágio

Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.