São Paulo, quarta-feira, 11 de outubro de 2000

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Obrigado, Brasil


O PT foi a grande referência para todos aqueles que querem um caminho alternativo para o nosso desenvolvimento


ALOIZIO MERCADANTE

O Partido dos Trabalhadores obteve nas eleições municipais de domingo retrasado uma das maiores vitórias eleitorais de sua história.
Enfrentando o poder econômico, a mobilização de recursos e de quadros políticos governamentais, a desproporção de espaços na mídia e até a manipulação de dados das pesquisas de opinião, o PT saiu do patamar de 7,9 milhões de votos, em 1996, para alcançar, nestas eleições, mais de 11,9 milhões de votos -um crescimento de mais de 50%. Em Estados como São Paulo, o PT foi o mais votado, com quase 1 milhão de votos a mais do que o partido que obteve o segundo lugar.
O PT elegeu no primeiro turno 174 prefeitos e o maior número de vereadores nas capitais: 95 vereadores, vários deles os mais votados em seus Estados. E das 32 cidades onde haverá segundo turno, o PT disputa a prefeitura em 16 e está em primeiro lugar em 13 delas.
Mas por que essa votação tão expressiva no PT? Creio que existem três razões principais para isso.
Primeiro, o sentimento das ruas -a "voz rouca das ruas", que o Planalto insiste em ignorar- é de oposição ao governo Fernando Henrique Cardoso.
O desemprego, a recessão prolongada, o arrocho salarial, o aumento mesquinho do salário mínimo, a situação dos aposentados, a degradação das políticas públicas de saúde e de educação, a destruição da base produtiva e as dificuldades que enfrentam as pequenas e microempresas do país geraram um crescente rechaço à atual política econômica e fortaleceram o sentimento de oposição ao governo.
O PT, junto aos demais partidos de esquerda, foi a grande referência para todos os que querem um caminho alternativo para o nosso desenvolvimento e que resgate essa imensa dívida social que nos envergonha.
Em segundo lugar está a questão da ética na política. O povo brasileiro está cansado da impunidade dos poderosos, das "operações abafa" dos escândalos e desvios de recursos públicos, não mais aceita o "rouba mas faz". O povo quer honestidade e transparência de seus governantes. E o PT tem sido um exemplo de honestidade e seriedade, especialmente no exercício parlamentar. Posso citar como referência a cidade de Embu das Artes, onde todos os vereadores foram cassados, menos um -o único vereador do PT. Pois esse vereador foi agora eleito prefeito. Essa experiência, simbólica, multiplica-se pelo país.
Vinte anos depois de criado, o PT tem uma cultura partidária, uma atitude na vida pública de compromisso com a ética na política. Esse patrimônio, que não tinha significado eleitoral, agora se expressa numa revolução silenciosa da cidadania, que caminha pelo Brasil.
O terceiro motivo desse expressivo avanço do PT foi o modo petista de governar. Programas como o de orçamento participativo, que foi um marco na Conferência Habitat 2, da ONU, o de bolsa-escola e o de renda mínima deram a um partido que só tinha 107 prefeituras os melhores prêmios da Fundação Abrinq (mais da metade deles) e prêmios da Unesco.
Essa forma de governar com mais sensibilidade social, que se expressa também em programas como o Banco do Povo e o Médico da Família e na democratização do Orçamento do município, é hoje uma grande referência interna que projeta a imagem do partido e irradia uma enorme energia positiva. E, ao contrário do que sugerem alguns analistas, o PT que ganhou não é um "outro" PT. É o mesmo PT comprometido com a luta dos trabalhadores, um partido com propostas concretas para a transformação da nossa sociedade.
O PT também reafirmou nessas eleições a sua condição de partido nacional, com vitórias importantes em diversas cidades da Bahia, em Aracaju (Sergipe), em Imperatriz (Maranhão), em cinco municípios paraenses, em sete do Acre, em seis de Rondônia, em 11 de Mato Grosso do Sul, em Ponta Grossa e outras cidades do Paraná e em 13 municípios de Santa Catarina. E com a passagem ao segundo turno em Recife e em Fortaleza (neste em coligação com o PC do B), em Belém, em Curitiba, em Londrina, em Maringá e em Goiânia.
Em regiões onde o PT já era importante, ampliou sua presença. No Rio Grande do Sul, venceu em Porto Alegre e em outros 35 municípios. Em todas as cidades onde haverá segundo turno, o PT disputa em condições de vencer, mostrando a continuidade da força do seu projeto. Em São Paulo, obteve grande vitória na capital, alcançando 38% dos votos. Além disso o partido venceu ou ficou em segundo lugar em todas as cidades com mais de 150 mil eleitores e teve 600 mil votos na legenda. No Rio de Janeiro, fez 22% dos votos da capital, mas ficou fora do segundo turno. Em Minas Gerais, venceu no primeiro turno em 34 municípios e, em Belo Horizonte, vai para o segundo turno com o PSB.
Esses resultados, no entanto, têm uma outra face. Evidenciam que, onde houve divisão interna, não houve avanço. Mostram também que, nos municípios menores, o PT ainda não construiu uma base adequada. Por outro lado aumentam a responsabilidade administrativa do partido. As tarefas que o PT tem de enfrentar não são fáceis. A situação fiscal e financeira é muito grave em várias das cidades em que o partido foi vitorioso. Tem, além disso, de suportar a forte pressão política do governo central e de seus adversários locais. Mas esse é o desafio, é o caminho da construção de um poder popular e de um novo projeto para o Brasil.


Aloizio Mercadante, 46, economista e professor licenciado da PUC e da Unicamp, foi candidato a vice-presidente da República com Lula em 1994, é deputado federal por São Paulo e líder da bancada do PT na Câmara.



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