São Paulo, quarta-feira, 11 de outubro de 2000

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PAINEL DO LEITOR

MST
"Lemos com atenção o artigo assinado pelo jornalista Josias de Souza, diretor da sucursal da Folha em Brasília, que trata do Movimento Sem Terra. O artigo parece não ter nenhum compromisso com a verdade e com a ética. O jornalista recebeu um relatório de sindicância, feito pelos funcionários do Incra por encomenda de seus diretores de Brasília, e, com base nele, o jornalista preparou seu brilhante artigo, passando a assumir as acusações que estão no relatório como se fossem verdade absoluta. Cita exemplos do assentamento de Bituruna (PR), mas não ouviu nenhum dos assentados para saber se era verdade o que os funcionários do Incra escreveram. Assume a acusação de que cobrar 3% sobre as operações de crédito é desvio de dinheiro público sem mencionar que na mesma operação o Banco do Brasil cobra 8% de taxa sem ser seu o dinheiro -e isso também seria um desvio de dinheiro público. O jornalista esconde o principal: os recursos são empréstimos, portanto, o agricultor vai pagá-los. Cerca de 60% dos recursos do empréstimo podem ser usados como mão-de-obra, e, portanto, ele faz o que quer com esse dinheiro. Mesmo em Estados em que não há nada citado no relatório, o jornalista se antecipa e faz o julgamento: certamente houve negligência dos funcionários. Se o jornalista estivesse de fato preocupado com a verdade, deveria ter feito também um artigo sobre outros relatórios que existem no Incra sobre desvio de recursos públicos para superdesapropriações, em que se beneficiaram latifundiários e funcionários do Incra. Desafiamos o jornalista comprovar de que houve algum tipo de apropriação indébita por parte do MST ou de dirigentes do MST, de recursos públicos. Aproveitamos para sugerir a mudança do nome da coluna, em vez de "No Planalto", ficaria melhor, mais coerente, "No Palácio do Planalto"."
Nilton Viana, assessor de comunicação do MST nacional (São Paulo, SP)

Resposta do jornalista Josias de Souza
- As sindicâncias do governo resultam de reportagem da Folha, de 16 de maio de 2000. O funcionalismo do Incra apenas comprovou o que este repórter havia levantado em visitas a assentamentos do Paraná. Curioso que o missivista tenha mencionado justamente o município de Bituruna (PR). É onde as investigações em torno do esquema montado pelo MST para subtrair dinheiro dos assentados encontram-se mais avançadas. O contribuinte brasileiro não entrega dinheiro aos assentados para que eles façam o que bem entender, mas para que o apliquem na terra. Muitos não têm conseguido pagar os empréstimos. A inadimplência da linha A do Pronaf chega a 30%, contra 2,5% nos outros tipos de financiamento público à agricultura familiar. O missivista empilha outros casos de desvio de conduta como se as falhas alheias funcionassem como salvo-conduto para a delinquência do MST, que bem poderia trocar o significado de sua sigla para "Movimento dos Sem Transparência". A carta representa, de todo modo, um avanço. Surgiu, finalmente, alguém disposto a falar em nome do MST. Falta só arrumar algo consistente para dizer.

Nota
"A propósito da nota intitulada "Laranja nanica", seção "Contraponto" (pág. A4) de ontem, quero esclarecer o que segue. Considerei ultrajante o título "Laranja nanica", não correspondendo à verdade quanto a minha pessoa. Durante as eleições municipais, procedi e cumpri o meu papel como candidato a prefeito de Maceió. Verdadeiramente, existem muitos interesses escusos contrários às minhas ações e trabalho de deputado federal pelo Estado de Alagoas. De modo algum me sinto intimidado diante da tarefa de denunciar os pseudo-moralistas e aqueles que lesam o erário, honrando assim aos quase 70 mil votos que obtive em 1998. Por fim, muito pior que ser acusado de laranja é ser corrupto!"
João Caldas, deputado federal pelo PL-AL (Brasília, DF)

Capacidade sem fim
"Os três vencedores do Prêmio Nobel de Medicina são Kandel, 70, Carlsson, 77, e Greengard, 74. Vários engenheiros técnicos no Brasil foram aposentados compulsoriamente entre 60 e 65 anos. O governo, seja federal, seja estadual, desmotiva a nata da inteligência brasileira. Não temos nenhum Prêmio Nobel no Brasil. Talvez porque nós sucateemos os capazes, porque os incapazes são incansáveis."
Afonso Hochreiter (São Paulo, SP)

Critérios
"O ministro Paulo Renato Souza publicou em 7/10 carta a respeito de notas publicadas no "Painel" em 27/9, sobre recente concurso público para o cargo de professor titular no Departamento de Ciência Política da USP. Nessa carta ele confirma ter entrado em contato com o reitor da USP para averiguar se o concurso havia sido conduzido pela banca examinadora conforme as regras estabelecidas e sem abusos. Não é este o lugar para discutir o gesto do ministro. Importa aqui enunciar fatos básicos com relação a esse episódio, para evitar uma imagem amesquinhada da vida universitária. Nesse concurso estavam inscritos os professores José Álvaro Moisés, Leonel Itaussú Almeida Mello e Maria Hermínia Tavares de Almeida. A banca examinadora era constituída pelos professores Dalmo Dallari, Elisa Reis, Gabriel Cohn (presidente), Lúcio Kowarick e Luiz Carlos Bresser Pereira. No final, tendo sido aprovados os três candidatos, mas só havendo duas vagas, foram classificados os professores Maria Hermínia, em primeiro lugar, e Leonel Mello, em segundo. Foi aprovado, mas não indicado, o professor Moisés, terceiro colocado. Esse resultado suscitou manifestações de mal-estar por parte de alguns colegas, com desdobramentos que acabaram envolvendo um ministro de Estado, o reitor da USP, o diretor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas e, finalmente, também a banca examinadora (pois só agora restrições à sua atuação tornam-se públicas, na carta do ministro, que ouviu, segundo ele, amigos e colegas, que o procuraram "indignados com o resultado'). Em comum acordo com os integrantes da banca, venho esclarecer um ponto central na carta do ministro. Não é verdade que, como afirma o ministro citando seus amigos e colegas, "a pontuação atribuída ao currículo do professor Moisés teria sido reduzida por ele estar afastado de suas funções na USP há cinco anos em razão de suas atividades no Ministério da Cultura". Pior ainda é afirmar que "um membro" da banca usou isso "como argumento". Há consenso na banca quanto à avaliação final, e todos os seus atos seguiram regras públicas e claras. Não é propriamente o afastamento que estava em causa, mas sim a atividade acadêmica no período. Simplesmente aplicou-se o Regimento Geral da USP, que é inequívoco a respeito. Cito o parágrafo único do art. 154: "No julgamento dos títulos deverão prevalecer as atividades desempenhadas nos cinco anos anteriores à inscrição". Essa exigência é de natureza acadêmica, e não meramente burocrática. Muito menos destoa do caráter público e aberto do concurso. Visa, desde logo, impedir que algum candidato obtenha dois títulos com o mesmo currículo. Havendo outros candidatos plenamente qualificados, que não estiveram afastados nos últimos cinco anos e que trabalharam intensamente, não se justifica qualquer "indignação"."
Gabriel Cohn, professor titular do Departamento de Ciência Política da USP (São Paulo, SP)



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