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JOSÉ SARNEY
A hora de harmonizar
O Brasil passa a viver um instante de profundas mudanças políticas. Em 1945, pela primeira vez em
nossa história parlamentar, chegavam
ao Congresso representantes declaradamente filiados à esquerda revolucionária, isto é, do Partido Comunista,
filiado ao movimento marxista internacional. A estrutura política conservadora não conseguiu assimilar essa
participação e, em dois anos, o PC era
considerado contrário às instituições
democráticas, seu registro era cassado
e seus representantes eram banidos
do parlamento.
Cinquenta anos depois, após os
avanços e recuos da história, com todos os hiatos institucionais que tivemos, o Congresso Nacional terá seu
maior partido oriundo das forças do
trabalho, com a bandeira de correções
e de mudanças no modelo tradicional
sem o caráter revolucionário existente
no passado.
O mundo mudou. Socialismo, hoje,
não é mais uma separação ideológica,
marcada por uma concepção teórica.
Passou a ser um estado de consciência
abrangente, característico das pessoas
que têm sensibilidade para o fato social, para a justiça social, num olhar
humano, e não numa concepção individualista da vida. Essa atitude aplicada à política constrói um socialista.
Bobbio chegou mesmo a escrever, na
linha dessa caracterização dos tipos
ideológicos, que não sabia nem nunca
soubera o que é um social-democrata.
A política real é hoje a massa de trabalho dos políticos. É essa política real
que vai ser o desafio do próximo governo. Tratar, como diz Elio Gaspari,
dos "elefantes voando."
A importância do Parlamento nesse
processo é fundamental. Ele será o suporte da estabilidade. Ultimamente se
criou no país o hábito de sempre julgar o Parlamento com uma visão
cáustica, crítica, sempre pessimista.
Na realidade, o Congresso é um corte
da sociedade, nem mais nem menos.
Com seus defeitos e virtudes, a maior
delas a de ser a caixa de ressonância
das reivindicações do povo, na qual se
questionam o governo, as instituições,
os modelos sociais, o próprio Parlamento e seus membros.
As decisões legislativas são abertas,
tomadas sob o controle da opinião
pública. As decisões do Executivo e do
Judiciário são conhecidas depois de
tomadas e não são sujeitas a interferências e a modificações durante o
próprio processo de decidir, muitas
vezes, monocrático. Isso leva a julgamentos interessados, porque, ao decidir, sempre se contraria alguém.
No novo modelo, que está chegando, precisamos de um Parlamento
responsável e forte. Sem Parlamento
forte, não há democracia. A mídia tem
de compreender que o Congresso não
é concorrente dela, mas participante, e
complementa sua tarefa de expressar
a opinião pública e de representar o
que melhor se deseja para o país.
É hora de conciliar. E conciliar é o
que a política tem de maior a fazer.
Devemos, assim, ter presente a sabedoria do provérbio nordestino: "Com
grito não se afina rabeca".
José Sarney escreve às sextas-feiras nesta coluna.
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