São Paulo, segunda-feira, 11 de outubro de 2004

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JOÃO SAYAD

FMI 2004

Na reunião deste ano, o FMI, o Banco Mundial e outros bancos de desenvolvimento trataram de dois temas: investimentos em infra-estrutura e financiamento em moeda nacional.
Todos os países subdesenvolvidos precisam fazer investimentos em infra-estrutura que não podem financiar com impostos ou endividamento.
Telecomunicações, energia elétrica e outros setores rentáveis foram privatizados e, em alguns casos, resolveram o problema. Mas não há forma de financiar investimentos realmente públicos -porque atendem populações pobres, que não podem pagar pelo serviço (saneamento básico, habitação popular, transporte público), ou porque são investimentos precursores, isto é, feitos antes de serem viáveis, com o propósito de atrair investimentos privados (estradas pioneiras ou pesquisa básica, por exemplo) .
O governo da maioria dos países subdesenvolvidos está muito endividado e usa impostos para pagar dívidas e juros. As dívidas foram causadas pela política monetária que tentou evitar desvalorizações cambiais, aumentando o endividamento público com juros altos ou causando falências bancárias que o governo precisa pagar. Os prejuízos são pagos com impostos. O discurso afirma que o endividamento vem de gastos sociais e com a previdência. Os números não confirmam.
O PPP (programa de parcerias público-privadas) é uma invenção financeira que tenta contornar o problema: o governo aluga (em vez de comprar) escolas, estradas, prisões ou pontes. Como um jovem casal que aluga um apartamento porque não tem dinheiro nem crédito para comprar.
Financiamento em moeda nacional quer dizer financiar o Brasil com dólares indexados ao real ou a Argentina com dólares indexados ao peso. Não se trata de emprestar reais para o Brasil, pois o Brasil não precisa de reais nem a Argentina precisa de pesos, moedas que podem ser "produzidas" pelos respectivos sistemas bancários.
Trata-se de tomar empréstimos em dólares indexados à moeda nacional. A empresa toma US$ 100 emprestados equivalentes a R$ 300 reais e promete pagar, no exterior, daqui a dez anos, dólares em valor equivalente a R$ 300 corrigidos pela inflação nacional mais os juros. São empréstimos simétricos ao que estamos acostumados no Brasil -reais indexados ao dólar.
É uma boa idéia. Os tomadores de empréstimos internacionais nesta modalidade não quebram depois de uma crise cambial -como as que ocorreram no Brasil e na Argentina- , pois suas dívidas são expressas na mesma moeda em que as empresas recebem suas receitas de venda.
A questão é saber se existe alguém disposto a financiar o Brasil, o México ou a Argentina correndo o risco da desvalorização cambial.
Financiamento em moeda nacional e PPP são remendos criativos que podem atenuar os problemas criados pela globalização financeira que endividou os Estados nacionais dos países subdesenvolvidos. E também para as restrições que o espirito do nosso tempo impõe contra os investimentos públicos que faltam no mundo inteiro.


João Sayad escreve às segundas-feiras nesta coluna.
jsayad@attglobal.net


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