São Paulo, terça-feira, 11 de novembro de 2008

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MARCOS NOBRE

O cidadão e o magistrado

É NO MÍNIMO intrigante encontrar declarações do presidente do STF todos os dias nos meios de comunicação. Ele se pronuncia sobre os temas mais variados da pauta da discussão pública, desde a edição de medidas provisórias até o uso de algemas.
Segundo a Lei Orgânica da Magistratura, em seu artigo 36, inciso III, é vedado ao magistrado "manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistrado".
Ao expor seus argumentos na esfera pública, o magistrado deixa o campo do direito e passa ao campo da disputa política. Como cidadão, deve ter o direito, sob determinadas condições, de expressar suas opiniões. As declarações de Gilmar Mendes não devem ser interpretadas como elaborações técnicas no campo do direito, mas como legítimos posicionamentos políticos.
Interpretados assim, tem-se a impressão de que seus pronunciamentos são críticas a órgãos ou políticas de governo. Ou condenações de movimentos como a greve de policiais civis em São Paulo. Às vezes parecem confrontos com declarações de integrantes do governo Lula, como foi o caso de seu pronunciamento sobre o "terrorismo" durante a ditadura militar.
O que intriga é justamente por que suas declarações dão essa impressão neste momento. E a resposta talvez esteja no fato de que a oposição se encontra amarrada em pelo menos dois sentidos.
Com crise econômica e tudo, a popularidade de Lula continua nas alturas. Qualquer postulante à candidatura presidencial pela oposição pode perder posições preciosas se criticar o governo Lula neste momento.
Além disso, os dois principais nomes da oposição são governadores de Estado. Tanto José Serra (mais que provável candidato oficial do PSDB) como Aécio Neves dependem do repasse regular de verbas federais para fazerem deslanchar a série de obras dos dois últimos anos de governo. Só para 2009, o investimento de Minas e de São Paulo estimado pela Folha é de R$ 30 bilhões.
Se a crise pegar forte por aqui, se a popularidade de Lula sofrer com isso, é possível que os líderes da oposição venham a assumir mais cedo o seu papel de críticos diuturnos do governo. Do contrário, só irão assumir essa posição no ano eleitoral de 2010, quando o ministro Gilmar Mendes deixará a presidência do STF. De um jeito ou de outro, o timing não poderia ser mais perfeito para a oposição.

nobre.a2@uol.com.br


MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras nesta coluna.


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