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São Paulo, quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

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TENDÊNCIAS/DEBATES

O "custo ONG" na conta de luz do brasileiro

PAULO MAYON


Urge um amplo esforço de comunicação para que se perceba o mal que está sendo produzido em nome da defesa do meio ambiente

AO ESCOLHER o filme do famoso espião britânico como opção de divertimento, mantinha a expectativa de uma película com lugares paradisíacos, moças bonitas e os inventivos aparelhos de espionagem.
Mas as expectativas se frustraram.
Pior ainda, se transformaram em objeto de perplexidade e reflexão. O excesso de ação contínua e o desaparecimento dos instrumentos criativos de apoio à missão fizeram parte da decepção. O aparelho mais sofisticado usado era um telefone celular.
Saí, na verdade, com uma sensação de ressaca misturada com um sentimento de "déjà vu". Não sou crítico de cinema, mas, depois de refletir um pouco e ler sobre a liminar da Justiça Federal de Rondônia suspendendo o processo de licenciamento da hidrelétrica de Jirau (3.300 MW), concluí que o filme não trazia nada de novo.
Com um pequeno esforço, é possível lembrar também da agressão ao engenheiro da Eletrobrás e de recentes coações aos funcionários da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) e da EPE (Empresa de Pesquisa Energética) em diversas situações. Nessa rápida associação de fatos, é inegável o reconhecimento de que, apesar de o setor elétrico brasileiro (SEB) ser extremamente organizado, não tem conseguido se fazer ouvir pela sociedade de forma extensiva e consistente.
Possuidor de amplo espectro de associações representando os mais diversos interesses em sua cadeia de produção, transmissão, distribuição, comercialização e consumo, o SEB vem evoluindo com aprimoramentos necessários na regulação, no marco legal e no planejamento.
Ocorre que, atuando de forma alinhada em tantas frentes simultâneas e de forma tão intensa, as associações talvez estejam gradualmente permitindo que inúmeras organizações, algumas muito sérias e outras que mais se parecem com a empresa sem fins lucrativos de Dominic Greene (o nome do "bandido" do filme) sensibilizem o Ministério Público de forma perene contra os investimentos em fontes renováveis.
Quem perde com isso? Todos nós, que passamos a receber, compulsoriamente, "goela abaixo", um pacote de energia movida à óleo e carvão, aumentando a emissão de carbono, ampliando o efeito estufa bem perto dos centros de consumo e gerando uma energia oito vezes mais cara se comparada àquelas cuja exploração tais organizações impedem.
Só no último leilão, foram selecionadas 50 termelétricas com capacidade de 12.800 MW, sendo 35% alimentados por óleo combustível. De hidrelétricas, só uma usina com 350 MW. É nítida a perda de competitividade que o setor industrial vem sofrendo. A carga de impostos e encargos setoriais que incide sobre a energia é gigante. Adicionar a esse fator um vetor de crescimento acelerado das fontes térmicas na matriz energética representa colocar em risco o crescimento da economia, dos empregos e da arrecadação. É o "custo ONG" na conta de luz de todos os brasileiros.
A agenda, enfim, está mudando. É urgente e necessário um amplo esforço de comunicação para que a sociedade perceba o mal que está sendo produzido em nome da defesa do meio ambiente. Caso contrário, em breve, será fundado o "Movimento dos Atingidos pelas ONGs Pseudo-Ambientalistas-Indigenistas".
Cabe inclusive lembrar que, na década de 1970, quando o ambientalismo dava os seus primeiros passos, diplomatas de peso como Araújo Castro e Miguel Ozório de Almeida já se empenhavam em reconhecê-lo corretamente como um instrumento político para o "congelamento do poder mundial", nas palavras do primeiro.
Hoje, mais do que nunca, a casa de Rio Branco precisa retomar aquela iniciativa positiva, que em muito contribuiu para atrasar em pelo menos uma década a penetração do radicalismo "verde" no Brasil.
Como proposição e uma das linhas importantes para evitar esse caminho, seria recomendável que, além do esforço de comunicação e diplomacia, todas as esferas que lidam diretamente com esses pleitos "a favor do meio ambiente" passassem, antes de dar trato ao assunto, a conhecer melhor essas organizações.
Há institutos sérios que atuam decifrando o "código genético" de cada uma das organizações que se dizem "verdes", como aquela do filme. Por meio de meticulosa análise das fontes de financiamento, muitas vezes é possível chegar aos reais interesses dos grupos. A cadeia de patrocinadores é muitas vezes complexa e com inúmeros cruzamentos, mas não é impossível decodificar esses caminhos.
Não contamos com o real serviço secreto britânico. Portanto, perante as teses do ambientalismo-indigenismo radicais, antes que capitulemos, devemos investir seriamente em desmontar esses esforços que buscam se sobrepor aos direitos da maioria da sociedade brasileira. Trata-se, em última instância, de um impedimento de utilização soberana de bens que, no final das contas, nos pertencem.


PAULO MAYON , 44, engenheiro de produção, é diretor-presidente da Anace (Associação Nacional dos Consumidores de Energia).

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